Obras completas de Fagundes Varela (1920)/Vozes da América/Child-Harold

SOBRE UMA PAGINA DE BYRON


Não te rias assim, oh! não te rias,
Basta de sonhos, de illusões fataes!
Minh’alma é núa, e do porvir ás luzes
Meus roxos labios sorrirão jamais!

Que pezar me consome! ah! não procures
Erguer a lousa de um pesar profundo,
Nem apalpares a materia livida,
E a lama impura que pernoita ao fundo!

Não são as flôres da ambição pisadas,
Não é a estrella de um porvir perdida...
Que esta cabeça coroou de sombras
E a tumba inclina ao despontar da vida!

É este enojo perenal, continuo,
Que em toda a parte me acompanha os passos,
E ao dia incende-me as arterias quentes,
Me aperta á noite nos mirrados braços!

São estas larvas de martyrio e dôres
— Socias constantes do judeu maldito! —
Em cuja testa, dos tufões crestada,
Labéo de fogo scintillava escripto!

Quem de si mesmo desterrar-se póde?
Quem póde a idéa aniquilar que o mata?
Quem póde altivo esmigalhar o espelho
Que a torva imagem de Satan retrata?

Quantos encontram ineffaveis gozos
N’esses prazeres, para mim tormentos!
Quantos nos mares onde a morte enxergo
Abrem as velas do baixel aos ventos!

O meu destino é vaguear e sempre!
Sempre fugindo a funeral lembrança...
Ferreo estylete que me rasga os musculos,
Voz dos abysmos que me brada: — Avança!

Que pezar me consome! ai! não mais tentes,
Espera a lousa de um pezar profundo,
Sómente a morte encontrarás nas bordas,
E o inferno inteiro a praguejar no fundo!