Constituição portuguesa de 1822/Título II: Da Nação Portuguesa, e seu território, religião, governo e dinastia

CAPÍTULO ÚNICO

ARTIGO 20o

A Nação Portuguesa é a união de todos os Portugueses de ambos os hemisférios. O seu território forma o Reino Unido de Portugal Brasil e Algarves, e compreende:

I. Na Europa, o reino de Portugal, que se compõe das províncias do Minho, Trás-os-Montes, Beira, Estremadura, Alentejo, e reino do Algarve, e das Ilhas adjacentes, Madeira, Porto Santo, e Açores:

II. Na América, o reino do Brasil, que se compõe das Províncias do Pará e Rio Negro, Maranhão, Piauí, Rio Grande do Norte, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Baía e Sergipe, Minas Gerais, Espírito Santo, Rio de Janeiro, S. Paulo, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Goiás, Mato Grosso, e das Ilhas de Fernando de Noronha, Trindade, e das mais que são adjacentes àquele reino:

III. Na África ocidental, Bissau e Cacheu; na Costa de Mina, o forte de S. João Baptista de Ajudá, Angola, Benguela e suas dependências, Cabinda e Molembo, as Ilhas de Cabo Verde, e as de S. Tomé e Príncipe e suas dependências: na Costa oriental, Moçambique, Rio de Sena, Sofala, Inhambane, Quelimane, e as Ilhas de Cabo Delgado:

IV. Na Ásia, Salsete, Bardez, Goa, Damão, Diu, e os estabelecimentos de Macau e das Ilhas de Solor e Timor.

A Nação não renuncia o direito, que tenha a qualquer porção de território não compreendida no presente artigo. Do território do Reino Unido se fará conveniente divisão.

ARTIGO 21o

Todos os Portugueses são cidadãos, e gozam desta qualidade:

I. Os filhos de pai Português nascidos no Reino Unido; ou que, havendo nascido em país estrangeiro, vieram estabelecer domicílio no mesmo reino: cessa porém a necessidade deste domicílio, se o pai estava no país estrangeiro em serviço da Nação:

II. Os filhos ilegítimos de mãe Portuguesa nascidos no Reino Unido; ou que, havendo nascido em país estrangeiro, vieram estabelecer domicílio no mesmo reino. Porém se forem reconhecidos ou legitimados por pai estrangeiro, e houverem nascido no Reino Unido, terá lugar a respeito deles o que abaixo vai disposto em o nº v; e havendo nascido em país estrangeiro, o que vai disposto em o nº vi:

III. Os expostos em qualquer parte do Reino Unido, cujos pais se ignorem:

IV. Os escravos que alcançarem carta de alforria:

V. Os filhos de pai estrangeiro, que nascerem e adquirirem domicílio no Reino Unido; contanto que chegados à maioridade declarem, por termo assinado nos livros da Câmara do seu domicílio, que querem ser cidadãos Portugueses:

VI Os estrangeiros, que obtiverem carta de naturalização

ARTIGO 22o

Todo o estrangeiro, que for de maior idade e fixar domicílio no Reino Unido, poderá obter a carta de naturalização, havendo casado com mulher Portuguesa, ou adquirido no mesmo reino algum estabelecimento em capitais de dinheiro, bens de raiz, agricultura, comércio, ou indústria; introduzido, ou exercitado algum comércio, ou indústria útil; ou feito à Nação serviços relevantes.

Os filhos de pai Português, que houver perdido a qualidade de cidadão, se tiverem maior idade e domicilio no Reino Unido, poderão obter carta de naturalização sem dependência de outro requisito.

ARTIGO 23o

Perde a qualidade de cidadão Português:

I. O que se naturalizar em país estrangeiro:

II. O que sem licença do Governo aceitar emprego, pensão, ou condecoração de qualquer Governo estrangeiro.

ARTIGO 24o

O exercício dos direitos políticos se suspende:

I. Por incapacidade física ou moral:

II. Por sentença que condene a prisão ou degredo, enquanto durarem os efeitos da condenação.

ARTIGO 25o

A Religião da Nação Portuguesa é a Católica Apostólica Romana. Permite-se contudo aos estrangeiros o exercício particular dos seus respectivos cultos.

ARTIGO 26o

A soberania reside essencialmente em a Nação. Não pode porém ser exercitada senão pelos seus representantes legalmente eleitos. Nenhum indivíduo ou corporação exerce autoridade pública, que se não derive da mesma Nação.

ARTIGO 27o

A Nação é livre e independente, e não pode ser património de ninguém. A ela somente pertence fazer pelos seus Deputados juntos em Cortes a sua Constituição, ou Lei Fundamental, sem dependência de sanção do Rei.

ARTIGO 28o

A Constituição, uma vez feita pelas presentes Cortes extraordinárias e constituintes, somente poderá ser reformada ou alterada, depois de haverem passado quatro anos, contados desde a sua publicação; e quanto aos artigos, cuja execução depende de leis regulamentares, contados desde a publicação dessas leis. Estas reformas e alterações se farão pela maneira seguinte:

Passados que sejam os ditos quatro anos, se poderá propor em Cortes a reforma, ou alteração que se pretender. A proposta será lida três vezes com intervalos de oito dias, e se for admitida à discussão, e concordarem na sua necessidade as duas terças partes dos Deputados presentes, será reduzida a decreto, no qual se ordene aos eleitores dos Deputados para a seguinte legislatura, que nas procurações lhes confiram especial faculdade para poderem fazer a pretendida alteração ou reforma, obrigando-se a reconhecê-la como constitucional no caso de chegar a ser aprovada.

A legislatura, que vier munida com as referidas procurações, discutirá novamente a proposta; e se for aprovada pelas duas terças partes, será logo havida como lei constitucional; incluída na Constituição; e apresentada ao Rei, na conformidade do art. 109, para ele a fazer publicar e executar cm toda a Monarquia.

ARTIGO 29o

O Governo da Nação Portuguesa é a Monarquia constitucional hereditária, com leis fundamentais, que regulem o exercício dos três poderes políticos.

ARTIGO 30o

Estes poderes são legislativo, executivo, e judicial. O primeiro reside nas Cortes com dependência da sanção do Rei (art. 110, 111 e 112.) O segundo está no Rei e nos Secretários de Estado, que o exercitam debaixo da autoridade do mesmo Rei. O terceiro está nos Juízes.

Cada um destes poderes é de tal maneira independente, que um não poderá arrogar a si as atribuições do outro.

ARTIGO 31o

A dinastia reinante é a da sereníssima casa de Bragança. O nosso rei actual é o senhor D. João VI.