Entreato cômico

Representado no Teatro Recreio Dramático, em 25 de outubro de 1907.

Personagens

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A viscondessa

Isaltina

Dudu

Luísa

Laura

Elisiária

Arnaldo Viegas

Pedro


Rio de Janeiro. Atualidade.

Sala em casa da viscondessa. Boa mobília, quadros, objetos de arte, etc. Porta ao fundo dando para o jardim. Duas portas à direita, janela à esquerda.

CENA I

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PEDRO, depois ARNALDO

(Ao levantar o pano, Pedro, o copeiro da casa, espana os móveis; alguns momentos depois, ouve-se uma campainha elétrica. Ele vai à porta do fundo e olha para fora).

PEDRO - Oh! O sr. dr. Arnaldo! Entre, sr. doutor! (Arnaldo entra). Como tem passado vossa senhoria? Vossa senhoria não se lembra de mim? Sou o Pedro... o Pedro, que foi copeiro de vossa senhoria!

ARNALDO - Ah!

PEDRO - Tenha a bondade de sentar-se.

ARNALDO - Obrigado. Estou bem.

PEDRO - A sra. d. Alice está boa?

ARNALDO - Creio que sim.

PEDRO - Não fique querendo mal à sra. d. Alice, não senhor; mas a sra. d. Alice foi muito injusta para comigo.

ARNALDO, quase interessado, a seu pesar: - Por quê?

PEDRO - Pois vossa senhoria não se lembra que ela me despediu sem razão?

ARNALDO - Não sei disso.

PEDRO - Eu fazia muito bem a minha obrigação; não havia motivo de queixa; entretanto, o pretexto foi que o meu serviço era mau. (Sorrindo). Depois vim a saber de tudo...

ARNALDO, desta vez interessado: - Tudo quê?

PEDRO - Quem me disse foi seu Ferreira.

ARNALDO - Quem é seu Ferreira?

PEDRO - O homem da venda. A cozinheira contou que eu era "onze letras" de vossa senhoria, que trazia recadinhos em segredo a vossa senhoria... Ora seja tudo por amor de Deus!...

ARNALDO - Bom! Isso não tem importância.

PEDRO - Como não tem importância? Tem importância, sim senhor! Eu sou um pobre criado de servir, um homem de cor, mas nunca foi Mercúrio de ninguém!

ARNALDO - Isso lá vai...

PEDRO - Nunca tive patroa mais ciumenta que aquela! Vossa senhoria vivia muito apoquentado!

ARNALDO, a quem desagrada a conversa, naturalmente por ser com quem é, - O visconde está em casa?

PEDRO - Está sim senhor... está ali (Apontando para a direita baixa), no seu gabinete, ocupado com a sua advocacia!... Oh! O sr. visconde trabalha muito! Às 6 da manhã já está de pé... Senta-se à mesa de trabalho e desunha até às 11, mesmo aos domingos, como hoje!

ARNALDO - Está sozinho?

PEDRO - Sozinho. A sra. viscondessa foi ouvir missa ali na matriz. É verdade que a missa está a acabar, e a sra. viscondessa não tarda ai com as amigas.

ARNALDO - As amigas?

PEDRO - Sim, senhor. Todos os domingos, depois da missa, ela traz consigo, da igreja, quatro ou cinco senhoras da vizinhança, que vêm tomar café e conversar, aqui na sala, sobre todos os assuntos da semana... é assim uma espécie de folhetim... (Animado por um quase sorriso de Arnaldo) Cortam na pele das outras... e principalmente das outras, que é um gostinho. Se vossa senhoria assistisse, escondido, a uma dessas conversas entre a missa e o almoço, divertia-se a valer! são terríveis! Sabem de tudo quanto se passa na casa alheia! A sra. viscondessa é a que menos fala, mas parece que dá o cavaquinho por ouvir falar. É uma boa senhora, vossa senhoria não acha?

ARNALDO - Acho que você não perderia nada se também falasse menos. Ande, leve o meu cartão ao visconde, e pergunte-lhe se me pode receber.

PEDRO (que recebe o cartão, sai pela direita e volta logo depois.) O sr. visconde pede a vossa senhoria que entre. (Arnaldo, que examinava os quadros, sai pela direita baixa. Ouvem-se os sinos da igreja próxima.) Chi! Acabou a missa e a sala não está completamente espanada! (Espana às pressas.) A sra. viscondessa, vendo um poucochinho de pé, faz um tempo quente! Bom! Pronto! Agora é tratar do café! (Olhando para fora ao passar pela porta do fundo). Era tempo: aí vem o folhetim'... (Sai pela direita alta).

CENA II

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A VISCONDESSA ISALTINA, DUDU, LUÍSA, LAURA E ELISIÁRIA

(Bem trajadas todas, mas em cabelo. Traz cada uma o seu livro de missa. A viscondessa vai para os cinqüenta. Dudu tem apenas dezessete anos. É mal-educada. Luísa, sua mãe, é quarentona. As outras são senhoras de vinte e cinco a trinta anos.)

A VISCONDESSA, entrando - Vão entrando sentem-se. Eu vou lá dentro ver o café. (Entram outras. Dudu vai para a janela).

ELISIÁRIA - Viscondessa, não se esqueça de recomendar que tragam a minha xícara com muito pouco açúcar! (A viscondessa sai pela direita alta).

LUÍSA - Tomara que o de hoje esteja melhor e o do domingo passado. Café, ou muito bom ou nenhum! (De repente, vendo Dudu à janela) Sai da janela, Dudu!

DUDU - Ora, mamãe!

LUÍSA - Não ouves! (Dudu sai da janela).

ELISIÁRIA - Há quatro, não: há cinco!

LAURA - Vocês também! Creio que há três!

ELISIÁRIA - Há cinco! Tem ouvido muita missa com aquela toilette!

LUÍSA - Pudera! O marido está pronto!

DUDU - Pronto para quê?

LUÍSA - "Pronto" quer dizer sem dinheiro.

DUDU - Nesse caso, também papai está pronto...

LUÍSA - Cala a boca, menina!

CENA III

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AS MESMAS, A VISCONDESSA, PEDRO

(A viscondessa entra da direita alta, acompanhada por Pedro, que traz o café numa bandeja de prata.)

A VISCONDESSA, às senhoras que estão de pé - Então, sentem-se!

(Estão sentadas todas. Pedro oferece-lhes café. Todas se servem).

ELISIÁRIA - Qual é a que tem pouco açúcar?

PEDRO - Esta. (Enquanto as senhoras tomam café, Pedro espera ao fundo, com a bandeja na mão. Luísa ao provar a sua xícara, faz uma careta).

VISCONDESSA - Está bom?

LUÍSA - Esplêndido!

LAURA - Magnífico!

ISALTINA - Delicioso!

DUDU, com ironia - Supimpa!

LUÍSA - Dudu!

(Pedro recolhe as xícaras vazias)

ISALTINA, pondo a sua xícara na bandeja - Estou tão habituada a este cafezinho depois da missa, que não poderia mais passar sem ele!

(Pedro sai pela direita alta, levando a bandeja. Silêncio).

DUDU solenemente - Está aberta a sessão! (Todos riem).

LUÍSA - Dudu!

VISCONDESSA - Esta menina tem lembranças! Pois bem, está aberta a sessão. Quem pede a palavra!

ISALTINA - Eu!

VISCONDESSA - Tem a palavra.

ISALTINA - Quero dar-lhes uma grande novidade.

TODAS - Qual?

ISALTINA - Uma novidade de sensação! Preparem-se!

VISCONDESSA - Estamos preparadas.

ISALTINA - A Alice Viegas separou-se anteontem do marido!

TODAS - Hein!

VISCONDESSA - Que está dizendo, Isaltina? Isso pode lá ser!

LUÍSA - Não é possível!

ISALTINA - É o que lhes digo: separaram-se! A Alice está em casa dos pais, no Andaraí. Vão tratar do divórcio!

VISCONDESSA - Quem lhe deu essa noticia?

ISALTINA - Pessoa fidedigna: o médico da casa que assistiu, sem querer, ao final da cena de rompimento, e depois foi ao Andaraí para ver a Alice, que estava excessivamente nervosa.

VISCONDESSA - O Dr. Getúlio?

ISALTINA - Esse mesmo. Como sabem, é meu compadre. Foi, como todos os sábados jantar comigo ontem e contou-me tudo.

DUDU - Ora! Briga de marido e mulher não dura. Qualquer dia têm saudades. um do outro e fazem as pazes!

LUÍSA - Cala a boca menina!

VISCONDESSA - É difícil de acreditar! O Arnaldo Viegas vivia com a mulher como dois pombinhos...

LAURA - Não quer dizer nada.

ISALTINA - As aparências iludem. Eles ultimamente não se podiam ver...

ELISIÁRIA - Pode ser tudo verdade. A minha engomadeira, que serviu em casa deles não há multo tempo, disse-me que andavam sempre como o cão e o gato.

VISCONDESSA, em tom repreensivo - E você calada, Elisiária?

ELISIÁRIA - Esqueci-me de lhes dizer.

ISAL~T1NA - Em todo o caso, não creio que a razão esteja com o marido...

DUDU, arrebatadamente - Por quê?

LUÍSA - Cala a boca, Dudu! Não te metas onde não és chamada!

LAURA - Conheço perfeitamente Alice; fomos companheiras de colégio; é uma senhora acima de qualquer suspeita.

ELISIÁRIA - Quem sabe lá? Tem se visto tanta coisa extraordinária!...

VISCONDESSA - Sim, tem-se visto muita coisa... mas não há dúvida que até hoje ninguém lembrou de dizer mal de Alice.

ISALTINA, apoiando - Ninguém. Não gosto dela nem ela de mim, mas devo ser justa! Ninguém, nem mesmo nós!...

LAURA - Por que é que você não gosta dela? Alice é tão boazinha!...

ISALTINA - Não duvido; mas de tempos a esta parte começou a tratar-me por cima do ombro, fingindo que não me vê quando me encontra em qualquer parte, minha amiga, mas não me quis dizer por que.

DUDU - Então seria melhor que não a prevenisse!

LUÍSA - Cala a boca, Dudu!

DUDU - Eu, quando me tratam mal, quero por quê!

LUÍSA - Então?

DUDU - Ora, mamãe! Estou dizendo alguma asneira?

LUÍSA - Estas conversas não são para senhoritas.

DUDU - Então por que a senhora me trouxe?

(Vai de mau modo para a janela).

ISALTINA - Sou tão superior a essas pequenices, que a defendo, mesmo sem conhecer os motivos da separação!

VISCONDESSA - Conheço de perto o Dr. Arnaldo, que é contraparente do visconde. É um moço distintíssimo, correto, bem-educado, e nada consta que o desabone.

ELISIÁRIA - A Alice tem um grande defeito.

TODAS, com interesse - Qual?

ELISIÁRIA - É muito ciumenta. A esse respeito a minha engomadeira contou-me coisas muito interessantes.

LUÍSA, vendo Dudu à janela - Dudu, sai da janela! Oh, que menina teimosa!...

VISCONDESSA - Deixa-a. Que tem?

LUÍSA - O filho do Oliveira estava na igreja e não tirava os olhos dela. Naturalmente anda a rondar. - Dudu!

DUDU, saindo da janela - Ora, mamãe!... Não sei o que faça!... Se fico aqui, não devo ouvir a conversa, que é gênero livre; se vou para a janela, não devo estar na janela! Que coisa! (Senta-se amuada a folhear um álbum de retratos).

LUÍSA - Coisa ruim!...

LAURA - Também eu creio que sejam os ciúmes o motivo da separação. O Dr. Viegas vivia num cortado!

ISALTINA - Minha cara, não há desconfiança de esposa que não tenha razão de ser. Isso de ciúmes infundados é uma história inventada pelos senhores homens. A Alice era ciumenta porque provavelmente o marido lhe dava razão para isso.

VISCONDESSA - Deus me livre de defender homens, mas hão de convir; há casos em que a injustiça de certas senhoras...

ISALTINA - As vitimas somos sempre nós!

ELISIÁRIA - Sempre? Isso é muito absoluto!

ISALTINA - Será, mas é assim mesmo. Nesse ponto sou intransigente. Defendo contra os homens até as minhas próprias inimigas!...

VISCONDESSA - É levar muito longe o feminismo ou o espírito do sexo.

ISALTINA - Não há maridos irrepreensíveis... e compreende-se: eles saem, vão a toda são parte, são livres, e não há ninguém que não abuse da liberdade... Isso está na massa do sangue humano... E nós ficamos em casa, metidas entre paredes...

DUDU - Entre quatro paredes? Pois sim! Há senhoras casadas que apanhando os maridos na rua...

LUÍSA - Cala a boca, Dudu.

ISALTINA - Se o Dr. Arnaldo Viegas aparecesse aqui neste momento, eu interpelá-lo-ia e vocês veriam se tenho ou não tenho razão!

(Abre-se a porta da direita baixa e aparece Arnaldo Viegas. Espanto geral. Todas as senhoras se levantam.)

CENA IV

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AS MESMAS, ARNALDO VIEGAS

ARNALDO, tomando a cena depois de uma larga pausa - O Dr. Arnaldo Viegas aqui está, minha senhora, e pronto para responder à interpelação... Ouvi sem querer... Estava naquele gabinete em conferência com o visconde, e ao sair...

VISCONDESSA - Não sabíamos. A sua presença foi para nós uma surpresa, e o seu aparecimento produziu um efeito verdadeiramente teatral (rindo-se). Mas não faça caso do que disse a Isaltina.

ISALTINA - Ah! Eu não recuo, viscondessa! Os homens não metem medo!...

ARNALDO - O mesmo não digo eu das mulheres, mas faz v. exa. muito bem e, uma vez que deseja interpelar-me, interpele-me à vontade!

DUDU - Quero ver como d. Isaltina descalça essa bota!

LUÍSA - Dudu!

ARNALDO - O assunto da interpelação não pode ser outro senão o lamentável incidente, que se acaba de dar na minha casa, e do qual foi testemunha, em parte, o Dr. Getúlio, compadre de v. exa. - mas vossas excelências estavam sentadas... levantaram-se quando eu entrei... queiram sentar-se. Também eu me sento. (Sentam-se todos). Pois, é verdade, minhas senhoras, separei-me de minha mulher. Era dela que falavam? Destruiu todo o meu laborioso sonho de futuro...

"Destruiu" é um modo de dizer: destruído estava ele há muito tempo. Agora mesmo solicitei do visconde que se encarregasse do meu processo de divórcio...

Divórcio?

Quando poderia eu pensar que o meu amor tivesse um epílogo judiciário! (Silêncio). Enganei-me? Não era esse o objeto da interpelação?

ISALTINA - Era, sim, senhor. Eu defendi sua senhora. O doutor bem sabe que ela, não sei por que, deixou de simpatizar comigo; portanto, não sou suspeita... Qual dos dois é o culpado? Ela? Duvido!

ARNALDO - Somos culpados ambos, ela e eu. Ela, porque era injusta, porque fazia da nossa casa um inferno e não me deixava trabalhar, e porque, casado há quase três anos, não tratei de corrigir desde os primeiros dias, os seus defeitos

De educação. Alice entendeu que eu deveria ser, não o seu esposo, não o seu companheiro, amante, leal e dedicado, mas o escravo dos seus caprichos, das

suas fantasias, das suas ilusões. Fiz todos os esforços para viver só para ela e para o trabalho, mas não consegui. Se continuássemos ligados um ao outro, em pouco tempo estaríamos velhos e gastos. Não nos compreendíamos, e já não nos amávamos. Não tínhamos filhos, éramos ricos, o melhor que podíamos fazer era procurar cada qual outro rumo. Foi o que fizemos.

ISALTINA - Mas Alice é uma senhora honesta.

ARNALDO - Quem diz o contrário? Posso dar o melhor testemunho da sua honestidade, empregando a palavra honestidade na acepção em que v. exa. a empregou, isto é, tenho certeza de que Alice, depois de casada, nunca pensou noutro homem que não fosse eu.

LUÍSA - Dudu, vai para a janela.

DUDU - Que coisa! (Vai para a janela).

ARNALDO - Ela é honesta, e também eu o sou, conquanto, ela e v. exas. não creiam. (Murmúrios de protestos). Mas a honestidade não basta para fazer a ventura de um casal; é preciso também o amor. Desde que este desapareceu para dar lugar à mentira e à hipocrisia, só as conveniências sociais me obrigariam a aceitar uma situação intolerável e eu - com perdão de v. exas. - declaro que não sacrifico a minha vida à sociedade, nem o meu quinhão de felicidade a essa moral despótica que é a desgraça dos fracos. Não sou fatalista, não creio na boa ou má sorte dos indivíduos, e acho que toda a criatura humana, quando mais não seja senão pelo instinto de conservação, tem o direito de remover quantos obstáculos as circunstâncias oponham à sua felicidade. O destino é um preconceito.

VISCONDESSA - Mas não me parece que o seu caso seja caso para divórcio.

ARNALDO - O divórcio não foi instituído exclusivamente para os desonestos. Serve também para os infelizes... para os que se ligaram por um equivoco. Apenas lamento que o não tenhamos ainda absoluto e completo e Alice e eu não possamos recobrar senão parte da nossa liberdade.

LAURA, tristemente - Alice era muito ciumenta.

ARNALDO - Ainda bem que v. exa. o sabe. Foram os seus ciúmes que envenenaram a nossa existência conjugal e deram cabo do nosso amor. Não eram zelos, que os zelos são um condimento melindroso de toda a afeição sincera; eram ciúmes, ciúmes terríveis, extravagantes, absurdos, odiosos, - ciúmes que me ofendiam profundamente e muitas vezes me colocavam numa situação desairosa e ridícula, - ciúmes de todas as senhoras com que eu falava - ciúmes das mulheres desconhecidas que se sentavam a meu lado no bonde ou no teatro: - ciúmes das amigas, das parentes, das criadas e até das cozinheiras....

ISALTINA - Não é crível que tantos ciúmes fossem à toa, não é crível que o doutor não lhe tivesse dado, ao menos, uma vez, razão para...

DUDU, deixando a janela - Isso agora é impertinência!

LUÍSA - Dudu!...

ARNALDO, depois de uma pausa, tomando uma resolução e aproximando a sua cadeira da de Isaltina - Ouça bem, minha senhora, e responda. Invertamos os papéis, agora quem interpela sou eu. Uma noite tive a honra de encontrá-la no Casino, durante uma partida, do Clube dos Diários, e troquei algumas palavras com v. exa. lembra-se?

ISALTINA - Perfeitamente. Foi o ano passado.

ARNALDO - Pois bem, as minhas palavras foram inconvenientes?... Eram palavras que v. exa. não pudesse ou não devesse ouvir?

ISALTINA - Oh, doutor!... essa pergunta!...

ARNALDO - Peço a v. exa. que me responda: algum dia faltei ao respeito devido a v. exa.?

ISALTINA - Nunca...! Nem eu o permitiria!

ARNALDO - Algum dia estive a sós com v. exa?

ISALTINA - Comigo?! Nunca!

ARNALDO - Algum dia v. exa. recebeu carta minha ou recado meu? Algum dia lobrigou nos meus olhares ou nos meus gestos a manifestação de um desejo impuro?

ISALTINA - Nunca!

ARNALDO - Pois bem, na opinião da minha mulher, v. exa. foi minha amante! (Levanta-se).

TODAS - Oh! (Levantam-se todas, menos Isaltina).

ARNALDO - Ela muitas vezes lançou à cara os meus amores com v. exa. e fartou-se de dizer a muita gente, inclusive ao Dr. Getúlio, compadre de v. exa. Pergunte-lho!

ISALTINA - Estou petrificada!

VISCONDESSA - O caso não é para menos.

ARNALDO - Creio que me justifiquei perfeitamente. Peço a v. exas. permissão para me retirar.. Viscondessa... minhas senhoras... (Cumprimenta).

TODAS - Doutor... (Arnaldo sai).

CENA V

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AS MESMAS, menos ARNALDO

ISALTINA, levantando-se e prorrompendo em pranto - Por esta não esperava eu!

DUDU - Pois eu esperava!

LUÍSA - Dudu!

VISCONDESSA - Não chore... Não há razão para tanto!...

ISALTINA - Estou muito nervosa.

VISCONDESSA - Isso passa, não é nada. Minhas amigas, o Dr. Arnaldo Viegas respondeu tão bem à interpelação que podemos, creio, votar uma moção de confiança.

TODAS, menos Isaltina - Apoiado!

DUDU - Está levantada a sessão!