A Divina Comédia (Xavier Pinheiro)/grafia atualizada/Inferno/XXI: diferenças entre revisões

Conteúdo apagado Conteúdo adicionado
adicionando notas de rodapé do tradutor
m clean up
Linha 59:
Dos pés prendia o nervo ao desditoso.
 
— ““Malebranche!”” já perto ele bradava —
&mdash; &#0147;“Eis um dos anciões de S. Zita<ref>Supremos magistrados de Lucca, cidade de que S. Zita é protetora. [N. T.]</ref>!
Mergulhai-o, pois torna à gente prava,
 
&#0147;“Que nessa terra em grande soma habita.
Venais todos lá são menos Bonturo<ref>Bonturo Dati, magistrado mais venal do que os outros. [N. T.]</ref>.
O no, por ouro, lá se muda em ita&#0147;“<ref>Por dinheiro o ''não'' se transforma em ''sim''. [N. T.]</ref>.
 
Ao pez o arroja, e pelo escolho duro
Linha 73:
O maldito afundou; surdiu curvado.
Sob a ponte os demônios lhe gritaram:
&mdash; &#0147;“Não acharás aqui Vulto Sagrado,
 
&#0147;“Nem banhos, quais no Serchio se deparam.
Se não queres no pez star imergido.
A te espetar as fisgas se preparam&#0148;”. &mdash;
 
Com croques cem mordendo esse descrido
&mdash; &#0147;“Bailar&#0148;” &mdash; disseram &mdash; &#0147;“deves bem coberto;
Se puderes furtar, furta escondido&#0148;”. &mdash;
 
Tal ordem em cozinha o mestre esperto
Linha 87:
Mergulhem naco à tona descoberto.
 
&mdash; &#0147;“Por que&#0148;” &mdash; falou-me o Guia &mdash; &#0147;“alguém não queira
Molestar-te em te vendo, busca abrigo:
Num recanto o acharás desta pedreira.
 
&#0147;“Não temas que me ofenda o bando imigo;
Muito bem sei como o furor lhe afronte;
Já venci de outra vez igual perigo&#0148;”. &mdash;
 
Até o extremo então passou da ponte;
Linha 105:
De baixo arremeteu-lhe o bando infido,
Aceso em ira, os croques seus brandindo.
Mas gritou-lhes: &mdash; &#0147;“Nenhum seja atrevido!
 
&#0147;“Os croques suspendi: até mim vindo
Me preste algum de vós atenção toda.
Fere, se ousais porém antes me ouvindo&#0148;”.
 
Clamaram todos: &mdash; &#0147;“Ouça &mdash; o Malacoda!&#0148;”
Enquanto os mais ficavam no seu posto,
&mdash; &#0147;“Que queres?&#0148;” &mdash; disse alguém que sai da roda;
 
E o Mestre: &mdash; &#0147;“És, Malacoda, a crer disposto
Que as ameaças vossas superasse
Para aqui vir, se por celeste gosto
Linha 121:
E supremo querer não caminhasse?
Deixa-me ir; pois a lei divina ordena.
Que eu nesta agra jornada outrem guiasse&#0148;”.
 
De Malacoda o orgulho já serena;
Aos pés lhe cai o croque; aos ais voltado
Lhes disse: &mdash; &#0147;“Este não pode sofrer pena&#0148;”.
 
E o Mestre me falou: &mdash; &#0147;“Tu, que abrigado
Estás entre os penedos cauteloso,
Volve a mim, do temor descativado&#0148;”.
 
Corri para Virgílio pressuroso.
Linha 143:
Os braços o meu corpo todo haviam.
 
Os croques inclinados: &mdash; &#0147;“No costado
Fisguemo-lo&#0148;” &mdash; entre si dois prorromperam.
E os outros: &mdash; &#0147;“Oh! pois não! seja espetado!&#0148;”
 
Ao que o Mestre falava desprouveram
Palavra tais, e então bradou depressa:
&#0147;“Sê quedo, Scarmiglione!&#0148;” &mdash; Emudeceram.
 
Depois assim nos disse: &mdash; &#0147;“Andar por essa
Rocha não podereis; jaz destruído
Todo arco sexto sem restar-lhe peça.
Linha 159:
Está rochedo ao passo apercebido.
 
&#0147;“Ontem, cinco horas mais do que este instante<ref>demônio falava cinco horas antes do meio-dia de 26 de março de 1300. Ao meio-dia teriam transcorrido 1266 anos da morte de Cristo. [N. T.]</ref>
Mil e duzentos com sessenta e seis
Anos houve: é então a rocha hiante.
 
&#0147;“Dos sócios meus na companhia ireis;
Vão ver se alguém ao banho quer furtar-se.
Ide em paz: molestados não sereis.
 
&#0147;“Calcabrina, Alichino vão juntar-se
Com Cagnazzo, a decúria comandando
Barbariccia! E não podem separar-se
 
&#0147;“Droghinaz, Libicocco, deste bando!
Graffiacane, o dentudo Ciriatto,
Farfarel, Rubicante vão marchando!
 
&#0147;“Na ronda cada qual se mostre exato!
Sejam a salvo os dois encaminhados
Da ponte ao arco até agora intato!&#0148;”
 
&#0147;“Que vejo, ó Mestre!&#0148;” &mdash; eu disse &mdash; &#0147;“Acompanhados!&#0148;”
Se sabes ir só, vamos prontamente;
De guias tais dispensam-se os cuidados.
 
&#0147;“Se tu és, como sóis, Mestre, prudente,
Não vês que os dentes seus estão rangendo,
Que nos encaram com furor crescente?&#0148;”
 
&#0147;“Não temas&#0148;” &mdash; disse o Mestre, respondendo &mdash;
&#0147;“Ranger os dentes deixa-os a seu gosto:
É contra os que ardem lá no pez horrendo&#0148;”.
 
À sestra os dez então fizeram rosto;