A Divina Comédia (Xavier Pinheiro)/grafia atualizada/Inferno/XXIX: diferenças entre revisões

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Que alívio em pranto procurar queriam.
 
““Por que assim”” — diz Virgílio — ““estás atento?
Por que a vista dos tristes mutilados
Prende-te ainda o duro sofrimento?
 
““Tal não fizeste em antros já passados.
Estão, se os resenhar é tenção tua,
Por milhas vinte e duas derramados.
 
““Já sob os nossos pés evolve a lua;
É-nos escasso o tempo concedido:
O que ainda hás de ver detença exclua””.
 
““Talvez se houveras”” — torno — ““conseguido
Ver o motivo, por que eu tanto olhava,
Mais demora tivesses permitido””.
 
Já se partia; e eu logo caminhava,
Enquanto assim falava-lhe em resposta,
Acrescentando: ““Lá, naquela cava,
 
““Onde a vista cuidosa estava posta,
Da stirpe minha um spírito carpia
Por culpa, a que mor pena está disposta””.
 
““Não te confranjas mais”” — responde o Guia —
““Nos males, que padece, cogitando.
De aí cuida; estar nesse antro merecia.
 
““Ao pé da ponte o vi, que, te indicando,
O dedo alçava em cominante gesto:
Geri del Bello estavam-no chamando.
 
““Eras absorto no semblante mesto
Daquele que senhor foi de Altaforte:
Quando atentaste, se ausentara presto””.
 
““Ó Mestre”” — eu disse — ““a violenta morte
Que ainda não punia justa vingança
De quem naquela afronta era consorte,
 
““Deu causa a usar, ao ver-me, essa esquivança
Talvez e ao seu silêncio: assim pensando
Maior piedade do seu mal me alcança””.
 
Ao rochedo chegamos praticando,
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Dos falsários em pena infinda prema.
 
““De Egina quando o povo adoecia,
E o ar maligno aos animais a morte
Trazendo, os próprios vermes extinguia,
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Ou de peixe, na casca mais horrendo.
 
““Ó tu”” contra um dos dois Virgílio exclama,
Que os dedos teus convertes em tenazes
Por desmalhar do corpo a extrema trama,
 
““Diz-me se entre estas almas contumazes
Existe algum Latino; eternamente
Sejam-te as unhas de servir capazes!””
 
““Latinos somos”” — torna diligente
Um dos dois padecentes lacrimoso,
““Mas tu quem és? Em declarar consente””.
 
— ““Eu sou que”” — diz Virgílio ao desditoso
““De círc?lo em círc?lo este homem vivo guia
Por lhe mostrar o abismo pavoroso””.
 
Já cessa o mútuo arrimo, que os unia:
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Acercou-se-me o Guia assim dizendo:
““Quanto quiseres tu agora dize””.
Eu logo comecei lhe obedecendo:
 
““Nunca a memória vossa finalize!
Na primeira mansão da humana raça!
Mas por sóis numerosos se abalize!
 
““Quem sois? E donde? De o dizer a graça
Fazei: a vossa pena, imunda é certo,
De responder-nos pejo vos não faça.
 
““De Arezzo fui”” disse um ““de Siena Alberto
Morte me deu nas chamas, truculento,
Por feito a que não fora o inferno aberto.
 
““Dissera, em gracejar só pondo o intento.
““Alçar-me aos ares posso velozmente””.
Essa arte, por ter curto o entendimento,
 
““Houve ele de saber desejo ardente.
Como o não fiz um Dédalo, à fogueira
Mandou-me quem seu pai foi certamente.
 
““Mas das cavas caí na derradeira
Por sentença de Minos rigorosa:
Foi meu crime a alquimia traiçoeira””.
 
E ao Vate eu disse: ““Nunca tão vaidosa
Gente, pôde alguém ver como a de Siena?
Nem a de França há sido tão sestrosa!””
 
O segundo leproso então me acena
Dizendo: ““Salvo Stricca, homem poupado,
Que todo o excesso em desprender condena!
 
““Salvo Nicoló, aquele que inventado
Do cravo tinha a rica especiaria,
O seu uso deixando enraizado!
 
““Salvo Caccia de Ascian e a companhia,
Com quem vinhas e bosques esbanjava
E o Abbagliato as chanças esgrimia!
 
““Para que saibas quem desta arte agrava
Contra os de Siena o teu severo asserto,
No meu triste semblante os olhos crava.
 
““De que ora vês Capocchio já estás certo,
Que alquimista, os metais falsificara,
Sabes como eu, se em recordar acerto,
 
Natura, hábil bugio, arremedara””.
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