A Divina Comédia (Xavier Pinheiro)/grafia atualizada/Paraíso/VII: diferenças entre revisões

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“&#0147;Hosannah Sanctus Deus Sabaoth,
Superillustrans daritate tua
Felices ignes horum malacòth!”&#0148;
 
Assim, voltando à melodia sua,
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Disse entre mim, pois dúvidas me entraram:
“&#0147;Fala à senhora tua, fala; à sede
Rocio as palavras suas te deparam.”&#0148;
 
Torvação me assenhora e a voz me impede,
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E aditara entre as chamas começava:
 
&mdash; “&#0147;Como bem vejo, dúvida domina
A tua alma: &mdash; a vingança, que foi justa,
Punição teve, da justiça di?na?
 
“&#0147;Esclarecer-te o espírito não custa.
Atende bem: verdade preminente
Das vozes minhas co?a expressão se ajusta.
 
“&#0147;Aceitar não querendo, obediente,
Saudável freio, o homem, sem mãe nado,
Perdeu-se a si, perdeu a humana gente.
 
“&#0147;Muitos séc?los enferma do pecado,
Jazeu ela não erro engrandecido
Té que o Verbo de Deus fosse encarnado.
 
“&#0147;Por ato só do Eterno Amor, unido
À natureza se há, que ao mal se dera,
Depois de esquiva ao Criador ter sido.
 
“&#0147;No que vou te dizer bem considera.
A natureza, a que se uniu beni?no
Em pessoa, nasceu boa e sincera.
 
“&#0147;Por si mesma, fugindo em desatino
Da vereda da vida e da verdade,
Do Paraíso se exilou divino.
 
“&#0147;Da Cruz a pena, em face da maldade
Da natureza, a que Jesus baixara,
Foi a mais justa em sua gravidade.
 
“&#0147;Nunca injustiça igual se praticara,
Atenta essa Pessoa, que há sofrido,
Que à natureza humana se ajuntara.
 
“&#0147;Contrastes, pois, de um ato hão procedido:
Folgam Judeus da morte a Deus jucunda,
Foi ledo o céu e o mundo espavorido.
 
“&#0147;E não te mova sensação profunda
Ouvir que uma vingança, que foi justa,
Vingada ser devia por segunda.
 
“&#0147;Vejo-te a mente por vereda angusta
Levada a estreito nó de dubiedade,
Que solver mor esforço ora te custa.
 
“&#0147;Dirás: &mdash; discerne o que ouço, na verdade;
Mas porque Deus nos desse está-me oculto,
Remindo-nos tal prova de bondade. &mdash;
 
“&#0147;Este decreto irmão, está sepulto
Aos olhos do que ainda o entendimento
Não tem de Amor na flama ainda adulto.
 
“&#0147;É mistério em que luta o pensamento
Sem fruto conseguir de tal porfia,
Mas foi o melhor modo. Ouve-me atento!
 
“&#0147;A Divina Bondade que desvia
De si o desamor, arde e flameja,
Por eternais primores se anuncia.
 
“&#0147;Diretamente o que emanado seja
Dela é sem fim; eterna impressão fica
Do que no seu querer supremo esteja.
 
“&#0147;O que assim nasce, não sujeito fica
Das causas secundárias à influência
E liberdade plena significa.
 
“&#0147;Mais lhe apraz, se é conforme à sua essência:
Que o santo Amor que em toda cousa brilha,
Mais vivo é no que encerra esta excelência.
 
“&#0147;Aos homens de tais bens cabe a partilha:
De tais predicados se um falece,
Sua nobreza já decai, se humilha.
 
“&#0147;Só por pecado dessa altura desce;
Do Sumo Bem não mais reflete o lume,
Semelhança não mais dele oferece.
 
“&#0147;E o grau sublime seu não mais assume,
Se não contrapuser ao do pecado
Deleite mau das penas o azedume.
 
“&#0147;Quando o gênero humano, infeccionado
Todo no germe seu, foi dessa alteza
E do seu Paraíso deserdado,
 
“&#0147;Reaver só pudera (com certeza
Verás, se bem cogitas), intervindo
Um dos meios, que aponto por clareza:
 
“&#0147;Ou Deus, por graça infinda, remitindo;
Ou &mdash; porque, de si mesmo, se convença &mdash;
Das culpas suas o homem se remindo.
 
“&#0147;Para sondar a profundeza imensa
Dos eternos conselhos, prende à mente
As razões que o discurso meu dispensa.
 
“&#0147;O homem não podia, de indigente,
As dívidas solver: nunca pudera
Curvar-se tanto, humilde e reverente,
 
“&#0147;Quanto, rebelde, se elevar quisera.
Eis por que redimir-se do pecado
Só por si mesmo ao homem não coubera.
 
“&#0147;E, pois há sido do divino agrado,
Por clemência ou justiça e ambas juntando,
Ser ele à vida eterna aparelhado.
 
“&#0147;A feitura do Autor ao gosto estando
Inda mais, quando a imagem nos of?rece
Do peito, de quem vem piedoso e brando,
 
“&#0147;A Bondade que em tudo transparece,
Em prol vosso os dois modos reunia:
Um somente bastar-lhe não parece.
 
“&#0147;Entre a noite final e o primo dia
Ato igual não se fez alto e formoso
Desse modo por um, nem se faria.
 
“&#0147;Dando-se, há sido Deus mais generoso,
Por que o home? a se erguer se habilitasse,
Do que só perdoando carinhoso.
 
“&#0147;Outro meio qualquer, que se empregasse
Não bastara à Justiça, se humilhando
De Deus o Filho à carne não baixasse.
 
“&#0147;Para de todo seres doutrinado
Eu torno a um ponto, por que vejas claro,
Como eu, o que zelosa hei te explicado.
 
“&#0147;Dizes: &mdash; no fogo e no ar, se bem reparo
Na terra e nágua vejo e em seus compostos
Corrupção que destrói sem anteparo.
 
“&#0147;Na criação por Deus foram dispostos:
De corrupção isentos ser deveram,
Certos sendo os princípios por ti postos. &mdash;
 
“&#0147;Criados, meu irmão, se consideram
Os anjos e dos céus o que há no espaço,
Inteiros, puros sempre quais nasceram.
 
“&#0147;Elementos e quanto no regaço
Da natura por eles se combina
De virtude criada of?recem traço.
 
“&#0147;Criou-lhes a matéria a lei divina,
Criando logo a força informativa,
Que nos astros, que os cercam, predomina.
 
“&#0147;Dos lumes santos moto e luz deriva
Dos brutos alma, e plantas igualmente,
Por compleição potencial passiva.
 
“&#0147;A vida nossa vem diretamente
De Deus, Supremo Bem, que em nós acende
Amor tal, que o deseja eternamente:
 
“&#0147;Daí, por dedução, também descende
Vossa ressurreição, se ao ser e à essência
Da humana carne o teu esp?rito atende,
 
Quando o primeiro par teve existência.”&#0148; &mdash;
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