A Divina Comédia (Xavier Pinheiro)/grafia atualizada/Purgatório/I: diferenças entre revisões

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<[[A Divina Comédia]]
|obra=[[A Divina Comédia]]
|autor=Dante Alighieri
|seção=[[A Divina Comédia/Purgatório|Purgatório]] &mdash; Canto I
|anterior=[[A Divina Comédia/Inferno/XXXIV|Inferno &mdash; Canto XXXIV]]
|posterior=[[A Divina Comédia/Purgatório/II|Canto II]]
|notas=Tradução de [[Autor:José Pedro Xavier Pinheiro|José Pedro Xavier Pinheiro]]
}}
 
''Saindo do Inferno, Dante respira novamente o ar puro e vê fulgentíssimas estrelas. Encontra-se na ilha do Purgatório.O guardião da ilha, Catão Uticense, pergunta aos dois Poetas qual é o motivo da sua jornada. Ele os instrui, depois, relativamente ao que devem fazer, antes de iniciar a subida do monte.''
 
<poem>
{| width=100%"
Do engenho meu a barca as velas solta
| width="55%"|<b>Tradução brasileira</b>
Para correr agora em mar jucundo,
| width="45%"|<b>Original italiano</b>
E ao despiedoso pego a popa volta.
|-
| valign="top"|<ul>
Do engenho meu a barca as velas solta<br/>
Para correr agora em mar jucundo,<br/>
E ao despiedoso pego a popa volta.<br/>
 
Aquele reino cantarei segundo,<br/>
Onde pela alma a dita é merecida<br/>
De ir ao céu livre do pecado imundo.<br/>
 
Ressurja ora a poesia amortecida,<br/>
Ó Santas Musas, a quem sou votado;<br/>
Unir ao canto meu seja servida<br/>
 
Calíope o som alto e sublimado,<brref>''Calíope'' — Musa da epopéia. [N. T.]</ref>
Que às Pegas esperar não permitira<brref>''Pegas'', as filhas de Pierio, desafiaram as Musas para cantarem com elas e, vencidas, foram transformadas em pegas. [N. T.]</ref>
Lhes fosse o atrevimento perdoado.<br/>
 
Suave cor de oriental safira,<br/>
Que se esparzia no sereno aspeito<br/>
Do ar até onde o céu primeiro gira,<br/>
 
Recreia a vista; e eu ledo me deleito<br/>
Em surdindo da estância tenebrosa,<br/>
Que tanto os olhos contristara e o peito.<br/>
 
A bela estrela, a amor auspiciosa<brref>''A bela estrela'', Vênus. [N. T.]</ref>
Sorrir alegre faz todo o Oriente,<br/>
Vela os Peixes, que a seguem, luminosa.<brref>''Os Peixes'', a constelação dos Peixes. [N. T.]</ref>
 
Ao outro pólo endereçando a mente,<br/>
Volto-me à destra, e os astros quatro vejo,<br/>
Que vira só a primitiva gente.<br/>
 
Folgar o céu parece ao seu lampejo.<br/>
Do Norte, ó região, viúva hás sido,<br/>
De os contemplar te não foi dado ensejo.<br/>
 
Depois de os remirar, já dirigido<br/>
Olhos havia para o pólo oposto,<br/>
Donde a Carroça havia-se partido,<br/>
 
Eis noto um velho, perto de mim posto,<brref>''Um velho'' etc., Catão Uticense, que, para não entregar-se a Júlio César, suicidou-se em Útica. [N. T.]</ref>
Que reverência tanta merecia,<br/>
Que mais do pai não deve o filho ao rosto.<br/>
 
Nas longas barbas nívea cor saía,<br/>
Sendo na coma sua semelhante,<br/>
Que em dupla trança ao peito lhe caía.<br/>
 
A luz dos santos astros rutilante<br/>
De fulgor tanto lhe aclarava o gesto,<br/>
Que o vi, como se o sol lhe fosse adiante.<br/>
 
— “Quem sois que em contra o rio escuro e mesto<brref>''Rio escuro e mesto'', o [[:w:rio Aqueronte|Aqueronte]]. [N. T.]</ref>
Do eterno cárcere heis fugido os laços?” —<br/>
Movendo as nobres plumas, disse presto.<br/>
 
“Quem vos guiou alumiando os passos<br/>
Para a profunda noite haver deixado,<br/>
Que enluta sempre os infernais espaços?<br/>
 
“As leis do abismo acaso se hão quebrado?<br/>
O céu dá, seus decretos revogando,<br/>
Que dos maus seja o meu domínio entrado?” —<br/>
 
Travou de mim Virgílio, me exortando<br/>
Por voz, aceno e mãos: como queria<br/>
Os joelhos curvei, olhos baixando.<br/>
 
— “De motu meu não vim” — lhe respondia —<br/>
De Dama aos rogos, que do céu descera<br/>
Socorro este homem, sirvo-lhe de guia.<br/>
 
Pois que é desejo teu que a nossa vera<br/>
Condição definida mais te seja,<br/>
Prestar me cumpro explicação sincera.<br/>
 
“Aura da vida este home’inda bafeja,<br/>
Mas tanto, de imprudente, se arriscara,<br/>
Que é maravilha vivo ainda esteja.<br/>
 
“Disse como a salvá-lo me apressara:<br/>
Por onde os passos dirigir pudesse<br/>
Essa vereda só se deparara.<br/>
 
“Mostrei-lhe a gente, que por má padece;<br/>
Mostrar-lhe intento os que ora estão purgando<br/>
Pecados no lugar, que te obedece.<br/>
 
“Longo seria como o vou guiando<br/>
Dizer-te: é força do alto a que me impele,<br/>
Para te ver e ouvir o encaminhando,<br/>
 
Digna-te, pois, bení’no ser com ele:<br/>
A liberdade anela, que é tão cara:<br/>
Sabe-o bem quem por ela a vida expele.<br/>
 
“Por ela a morte não te há sido amara<br/>
Em Útica, onde a veste foi deixada,<br/>
Que em Juízo há de ser de luz tão clara.<br/>
 
“Por nós eterna lei não é violada:<br/>
Ele inda vive; Minos não me empece;<br/>
No círc’lo estou, onde acha-se encerrada<br/>
 
“Tua Márcia, que em casto olhar parece<brref>''Márcia'', esposa de Catão. [N. T.]</ref>
Rogar-te ainda que por tua a tenhas:<br/>
Lembrando-a em favor nosso te enternece.<br/>
 
“Ir deixa aos reinos teus, não nos retenhas;<br/>
Hei de a Márcia dizê-lo agradecido,<br/>
Se lá de ti falar-se não desdenhas.” —<br/>
 
— “Márcia, a meus olhos tão jucunda há sido<br/>
Que — tornou-lhe Catão — eu de bom grado<br/>
No mundo quanto quis lhe hei concedido.<br/>
 
“Estando além do rio detestado,<br/>
Mover-me ora não pode: este preceito<br/>
Me foi, deixando o Limbo, decretado.<br/>
 
“Se por dama celeste hás sido eleito,<br/>
Como disseste, é vã lisonja agora;<br/>
O que requeres em seu nome aceito.<br/>
 
“Vai, pois: cingindo este homem sem demora<br/>
De liso junco, lava-lhe o semblante;<br/>
Toda a impureza seja posta fora.<br/>
 
“Cumpre que, quando ele estiver perante<br/>
O anjo, que do céu vier primeiro,<br/>
Névoa nenhuma os olhos lhe quebrante.<br/>
 
“Lá onde baixa o ponto derradeiro<br/>
Do mar batido, esta ilha tem viçoso<br/>
Juncal que alastra todo o seu nateiro.<br/>
 
“Não pode vegetal rijo ou frondoso<br/>
Ter vida ali; porque não dobraria<br/>
Ao embate das ondas caprichoso.<br/>
 
“Aqui tornar inútil vos seria.<br/>
Vereis ao sol, que surge, o melhor passo<br/>
Para subir do monte à penedia.” —<br/>
 
Sumiu-se. Ergui-me, então, sem mais espaço,<br/>
E em silêncio; olhos fitos no semblante<br/>
De Virgílio, amparei-me com seu braço.<br/>
 
— “Comigo, ó filho” — diz-me — “segue avante.<br/>
Atrás voltemos; pois daqui se inclina<br/>
O plano para o mar, que jaz distante.” —<br/>
 
Fugia ante a alva a sombra matutina;<br/>
Já nos ficava aos olhos descoberta,<br/>
Posto remota, a oscilação marina.<br/>
 
Pela planície andávamos deserta,<br/>
Como quem trilha a estrada, que perdera,<br/>
E teme não achar vereda certa.<br/>
 
Chegando à parte, onde não pudera<br/>
Do rocio triunfar o sol nascente,<br/>
Porque à sombra o frescor pouco modera,<br/>
 
Sobre a relva meu Mestre brandamente<br/>
As mãos ambas abriu: o movimento<br/>
Lhe noto e, o compreendo, diligente,<br/>
 
As lacrimosas faces lhe apresento.<br/>
Virgílio as cores restaurou-me ao gesto,<br/>
Que desbotara o inferno nevoento.<br/>
 
Vimos à erma praia a passo lesto:<br/>
Nunca sobre águas suas navegara<br/>
Homem que o mundo torne a ver molesto.<br/>
 
Cingido fui, como Catão mandara.<br/>
Portento! A humilde planta renascida,<br/>
Qual antes vi no solo, onde a arrancara,<br/>
 
Sem diferença, de súbito crescida.<br/>
</ulpoem>
 
== Notas ==
| valign="top"|<ul>
<references />
Per correr miglior acque alza le vele<br/>
omai la navicella del mio ingegno,<br/>
che lascia dietro a sé mar sì crudele;<br/>
 
e canterò di quel secondo regno<br/>
dove l'umano spirito si purga<br/>
e di salire al ciel diventa degno.<br/>
 
Ma qui la morta poesì resurga,<br/>
o sante Muse, poi che vostro sono;<br/>
e qui Calïopè alquanto surga,<br/>
 
seguitando il mio canto con quel suono<br/>
di cui le Piche misere sentiro<br/>
lo colpo tal, che disperar perdono.<br/>
 
Dolce color d'orïental zaffiro,<br/>
che s'accoglieva nel sereno aspetto<br/>
del mezzo, puro infino al primo giro,<br/>
 
a li occhi miei ricominciò diletto,<br/>
tosto ch'io usci' fuor de l'aura morta<br/>
che m'avea contristati li occhi e 'l petto.<br/>
 
Lo bel pianeto che d'amar conforta<br/>
faceva tutto rider l'orïente,<br/>
velando i Pesci ch'erano in sua scorta.<br/>
 
I' mi volsi a man destra, e puosi mente<br/>
a l'altro polo, e vidi quattro stelle<br/>
non viste mai fuor ch'a la prima gente.<br/>
 
Goder pareva 'l ciel di lor fiammelle:<br/>
oh settentrïonal vedovo sito,<br/>
poi che privato se' di mirar quelle!<br/>
 
Com' io da loro sguardo fui partito,<br/>
un poco me volgendo a l'altro polo,<br/>
là onde 'l Carro già era sparito,<br/>
 
vidi presso di me un veglio solo,<br/>
degno di tanta reverenza in vista,<br/>
che più non dee a padre alcun figliuolo.<br/>
 
Lunga la barba e di pel bianco mista<br/>
portava, a' suoi capelli simigliante,<br/>
de' quai cadeva al petto doppia lista.<br/>
 
Li raggi de le quattro luci sante<br/>
fregiavan sì la sua faccia di lume,<br/>
ch'i' 'l vedea come 'l sol fosse davante.<br/>
 
«Chi siete voi che contro al cieco fiume<br/>
fuggita avete la pregione etterna?»,<br/>
diss' el, movendo quelle oneste piume.<br/>
 
«Chi v'ha guidati, o che vi fu lucerna,<br/>
uscendo fuor de la profonda notte<br/>
che sempre nera fa la valle inferna?<br/>
 
Son le leggi d'abisso così rotte?<br/>
o è mutato in ciel novo consiglio,<br/>
che, dannati, venite a le mie grotte?».<br/>
 
Lo duca mio allor mi diè di piglio,<br/>
e con parole e con mani e con cenni<br/>
reverenti mi fé le gambe e 'l ciglio.<br/>
 
Poscia rispuose lui: «Da me non venni:<br/>
donna scese del ciel, per li cui prieghi<br/>
de la mia compagnia costui sovvenni.<br/>
 
Ma da ch'è tuo voler che più si spieghi<br/>
di nostra condizion com' ell' è vera,<br/>
esser non puote il mio che a te si nieghi.<br/>
 
Questi non vide mai l'ultima sera;<br/>
ma per la sua follia le fu sì presso,<br/>
che molto poco tempo a volger era.<br/>
 
Sì com' io dissi, fui mandato ad esso<br/>
per lui campare; e non lì era altra via<br/>
che questa per la quale i' mi son messo.<br/>
 
Mostrata ho lui tutta la gente ria;<br/>
e ora intendo mostrar quelli spirti<br/>
che purgan sé sotto la tua balìa.<br/>
 
Com' io l'ho tratto, saria lungo a dirti;<br/>
de l'alto scende virtù che m'aiuta<br/>
conducerlo a vederti e a udirti.<br/>
 
Or ti piaccia gradir la sua venuta:<br/>
libertà va cercando, ch'è sì cara,<br/>
come sa chi per lei vita rifiuta.<br/>
 
Tu 'l sai, ché non ti fu per lei amara<br/>
in Utica la morte, ove lasciasti<br/>
la vesta ch'al gran dì sarà sì chiara.<br/>
 
Non son li editti etterni per noi guasti,<br/>
ché questi vive e Minòs me non lega;<br/>
ma son del cerchio ove son li occhi casti<br/>
 
di Marzia tua, che 'n vista ancor ti priega,<br/>
o santo petto, che per tua la tegni:<br/>
per lo suo amore adunque a noi ti piega.<br/>
 
Lasciane andar per li tuoi sette regni;<br/>
grazie riporterò di te a lei,<br/>
se d'esser mentovato là giù degni».<br/>
 
«Marzïa piacque tanto a li occhi miei<br/>
mentre ch'i' fu' di là», diss' elli allora,<br/>
«che quante grazie volse da me, fei.<br/>
 
Or che di là dal mal fiume dimora,<br/>
più muover non mi può, per quella legge<br/>
che fatta fu quando me n'usci' fora.<br/>
 
Ma se donna del ciel ti move e regge,<br/>
come tu di', non c'è mestier lusinghe:<br/>
bastisi ben che per lei mi richegge.<br/>
 
Va dunque, e fa che tu costui ricinghe<br/>
d'un giunco schietto e che li lavi 'l viso,<br/>
sì ch'ogne sucidume quindi stinghe;<br/>
 
ché non si converria, l'occhio sorpriso<br/>
d'alcuna nebbia, andar dinanzi al primo<br/>
ministro, ch'è di quei di paradiso.<br/>
 
Questa isoletta intorno ad imo ad imo,<br/>
là giù colà dove la batte l'onda,<br/>
porta di giunchi sovra 'l molle limo:<br/>
 
null' altra pianta che facesse fronda<br/>
o indurasse, vi puote aver vita,<br/>
però ch'a le percosse non seconda.<br/>
 
Poscia non sia di qua vostra reddita;<br/>
lo sol vi mosterrà, che surge omai,<br/>
prendere il monte a più lieve salita».<br/>
 
Così sparì; e io sù mi levai<br/>
sanza parlare, e tutto mi ritrassi<br/>
al duca mio, e li occhi a lui drizzai.<br/>
 
El cominciò: «Figliuol, segui i miei passi:<br/>
volgianci in dietro, ché di qua dichina<br/>
questa pianura a' suoi termini bassi».<br/>
 
L'alba vinceva l'ora mattutina<br/>
che fuggia innanzi, sì che di lontano<br/>
conobbi il tremolar de la marina.<br/>
 
Noi andavam per lo solingo piano<br/>
com' om che torna a la perduta strada,<br/>
che 'nfino ad essa li pare ire in vano.<br/>
 
Quando noi fummo là 've la rugiada<br/>
pugna col sole, per essere in parte<br/>
dove, ad orezza, poco si dirada,<br/>
 
ambo le mani in su l'erbetta sparte<br/>
soavemente 'l mio maestro pose:<br/>
ond' io, che fui accorto di sua arte,<br/>
 
porsi ver' lui le guance lagrimose;<br/>
ivi mi fece tutto discoverto<br/>
quel color che l'inferno mi nascose.<br/>
 
Venimmo poi in sul lito diserto,<br/>
che mai non vide navicar sue acque<br/>
omo, che di tornar sia poscia esperto.<br/>
 
Quivi mi cinse sì com' altrui piacque:<br/>
oh maraviglia! ché qual elli scelse<br/>
l'umile pianta, cotal si rinacque<br/>
 
subitamente là onde l'avelse.
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