Viagens na Minha Terra (1846)/I: diferenças entre revisões

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<p align="right">''Qu' il est glorieux d'ouvrir une nouvelle carrière, et de paraitre<br />tout-à-coup dans le monde savant un livre de découvertes à la main,<br />comme une cométe inattendue étincelle dans l'espace!''<br />X. DE MAISTRE.</p>
 
<center>CAPITULO I.</center>
 
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Era o C. da T. que chegava.
 
:--'Este conheço eu; este é dos nossos (bradou um homem de forcado, assim que o viu). Isto é um fidalgo como se quer. Nunca o vi n'uma ferra, isso é verdade; mas aqui de Vallada a Almeirim ninguem corre mais do que elle por sol e por chuva, e hade saber o que é um boi de lei, e o que é lidar com gado.'
 
:--'Pois oiçamos lá a questão.'
:--'Não é questão'--tornou o Ilhavo: 'mas se este senhor fidalgo anda por Almeirim, para Almeirim vamos nós, que era uma charneca o outro dia, e hoje é um jardim, benza-o Deus!--mas não foram os campinos que o fizeram, foi a nossa gente que o sachou e plantou, e o fez o que é, e fez terra das areas da charneca.'
 
:--'Lá isso é verdade'.
--'Não é questão'--tornou o Ilhavo: 'mas se este senhor fidalgo anda por Almeirim, para Almeirim vamos nós, que era uma charneca o outro dia, e hoje é um jardim, benza-o Deus!--mas não foram os campinos que o fizeram, foi a nossa gente que o sachou e plantou, e o fez o que é, e fez terra das areas da charneca.'

--'Lá isso é verdade'.

--'Não, não é! Que está forte habilidade fazer dar trigo aqui aos nateiros do Tejo, que é como quem semeia em manteiga. É uma lavoira que a faz Deus por sua mão, regar e adubar e tudo: e o que Deus não faz, não fazem elles, que nem sabem ter mão n'esses monchões c'o plantio das arvores: so lá por cima é que algumas teem mettido, e é bem pouco para o rio que é, e as riccas terras que lhes levam as inchentes.--Mas nós, pe no barco pe na terra, tam depressa estamos a sachar o milho na charneca, como vimos por ahi abaixo com a vara no peito, e o saveiro a pegar n'area por não haver agua... mas sempre labutando pela vida'.
 
: --'A fôrça é que se falla'--tornou o campino para estabelecer a questão em terreno que lhe convinha.--'A fôrça é que se falla: um homem do campo que se deita alli á cernelha de um toiro que uma companha inteira de varinos lhe não pegava, com perdão dos senhores pelo rabo!..'
 
E reforçou o argumento com uma gargalhada triumphante, que achou echo nos interessados circumstantes que ja se tinham apinhado a ouvir os debates.
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Mas o orador ilhavo não era homem de se dar assim por derrotado. Olhou para os seus, como quem os consultava e animava, com um gesto
expressivo, e voltando-se a nós, com a direita estendida aos seus antagonistas:
 
:--'Então agora como é de fôrça, quero eu saber, e estes senhores que digam, qual é que tem mais fôrça, se é um toiro ou se é o mar'.
: --'Essa agora!..'
 
: --'Queriamos saber'.
: --'ÉEssa o maragora!..'.
 
: --'Pois nós que brigâmos com o mar, oito e dez dias a fio n'uma tormenta, de Aveiro a Lisboa, e estes que brigam uma tarde com um toiro, qual é que tem mais fôrça?'
: --'Queriamos saber'.
 
--'É o mar'.
 
: --'Pois nós que brigâmos com o mar, oito e dez dias a fio n'uma tormenta, de Aveiro a Lisboa, e estes que brigam uma tarde com um toiro, qual é que tem mais fôrça?'
 
Os campinos ficaram cabisbaixos; o publico imparcial applaudiu por ésta vez a opposição, e o Vouga triumphou do Tejo.
 
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