Cinco Minutos/VIII: diferenças entre revisões

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Aí era impossível que o ar não desse vida; que o raio do sol não viesse impregnado de um átomo de fogo celeste; que a água, as árvores, a terra, cheia de tanta seiva e de tanto vigor, não inoculassem na criatura essa vitalidade poderosa da natureza no seu primitivo esplendor.
 
Iríamos, pois, a uma dessas solidões desconhecidas; o mundo abria-se diante de nós, e eu sentia-me com bastante força e bastante coragem para levar o meu tesouro além dos ma- resmares e das montanhas, até achar um retiro onde esconder a nossa felicidade.
 
Nesses desertos, tão vastos, tão extensos, não haveria sequer vida bastante para duas criaturas que apenas pediam um palmo de terra e um sopro de ar, a fim de poderem elevar a Deus, como uma prece constante, o seu amor tão puro?
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— Ao meio-dia.
 
Eram onze horas; no espaço de uma hora eu faria as quatro léguas que me separavam daquele porto.
 
daquele porto.
 
Lancei os olhos em torno de mim com uma espécie de desvairo
 
Não tinha um trono, como Ricardo III, para oferecer em troca de um cavalo; mas tinha a realeza do nosso século, tinha dinheiro.
 
A dois passos da porta do hotel estava um cavalo, que o seu dono tinha pela rédea. — Compro-lhe este cavalo, disse eu caminhando para ele, sem mesmo perder tempo em cumprimentá-lo.
a realeza do nosso século, tinha dinheiro.
 
— Não pretendia vendê-lo, respondeu-me o homem cortesmente; mas, se o senhor está disposto a dar o preço que ele vale...
A dois passos da porta do hotel estava um cavalo, que o seu dono tinha pela rédea. — Compro-lhe este cavalo, disse eu caminhando para ele, sem mesmo perder tempo
 
em cumprimentá-lo.
 
— Não pretendia vendê-lo, respondeu-me o homem cortesmente; mas, se o senhor está
 
disposto a dar o preço que ele vale...
 
— Não questiono sobre o preço; compro-lhe o cavalo arreado como está.
 
O sujeito olhou-me admirado; porque, a falar a verdade, os seus arreios nada valiam. Quanto a mim, já tinha-lhe tomado as rédeas da mão; e, sentado no selim, esperava que me dissesse quanto tinha de pagar-lhe.
 
que me dissesse quanto tinha de pagar-lhe.
 
— Não repare, fiz uma aposta e preciso de um cavalo para ganhá-la.
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— Estimo que ganhe a aposta; o animal é excelente!
 
Na verdade era uma aposta que eu tinha feito comigo mesmo, ou antes com a minha razão, a qual me dizia que era impossível apanhar a barca, e que eu fazia uma extravagância sem necessidade, pois bastava ter paciência por vinte e quatro horas.
 
razão, a qual me dizia que era impossível apanhar a barca, e que eu fazia uma extravagância sem necessidade, pois bastava ter paciência por vinte e quatro horas.
 
Mas o amor não compreende esses cálculos e esses raciocínios próprios da fraqueza humana; criado com uma partícula do fogo divino, ele eleva o homem acima da terra, desprende-o da argila que o envolve, e dá-lhe força para dominar todos os obstáculos, para querer o impossível.
 
Esperar tranqüilamentetranquilamente um dia para ir dizer-lhe que eu amava e queria amá-la com todo o culto e admiração que me inspirava a sua nobre abnegação, me parecia quase uma in- fâmiainfâmia.
 
Seria dizer-lhe que tinha refletido friamente, que tinha pesado todos os prós e os contras do passo que ia dar, que havia calculado como um egoísta a felicidade que ela me oferecia.
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— Não importa; pagarei o seu trabalho, também o incômodo que isto lhe causa.
 
— Não posso, não, senhor, não é lá pela paga que eu digo que estou chegando; mas é que passar a noite no mar sem dormir não é lá das melhores coisas; e estou caindo de sono.
 
que passar a noite no mar sem dormir não é lá das melhores coisas; e estou caindo de sono.
 
— Escute, meu amigo...
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— Qual! rende nada!...
 
— Ora diga-me! Se houvesse um meio de fazer-lhe ganhar em um só dia o que pode ganhar em um mês, não enjeitaria decerto?
 
ganhar em um mês, não enjeitaria decerto?
 
— Isto é coisa que se pergunte?
 
— Quando mesmo fosse preciso embarcar depois de passar uma noite em claro no mar?
 
mar?
 
— Ainda que devesse remar três dias com três noites, sem dormir nem comer.
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— Assim, é negócio decidido. Vamos embarcar?
 
— Com licença; preciso de um instantinho para prevenir a mulher; mas é um passo lá e outro cá.
 
e outro cá.
 
— Olhe, não se demore; tenho muita pressa.
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— É em um fechar de olhos, disse ele correndo na direção da vila.
 
Mal tinha feito vinte passos, parou, hesitou, e por fim voltou lentamente pelo mesmo caminho.
 
Eu tremia; julgava que se tinha arrependido, que vinha apresentar-me alguma nova dificuldade. Chegou-se para mim de olhos baixos e coçando a cabeça.
caminho.
 
Eu tremia; julgava que se tinha arrependido, que vinha apresentar-me alguma nova
 
dificuldade. Chegou-se para mim de olhos baixos e coçando a cabeça.
 
— O que temos, meu amigo? perguntei-lhe com uma voz que esforçava por tornar calma.
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— Decerto; e, se duvida, disse levando a mão ao bolso.
 
Não, senhor, Deus me defenda de desconfiar do senhor! Mas é que... sim, não vê, o mês agora tem menos um dia que os outros!
 
Não pude deixar de sorrir-me do temor do velho; nós estávamos com efeito, no mês de fevereiro.
o mês agora tem menos um dia que os outros!
 
Não pude deixar de sorrir-me do temor do velho; nós estávamos com efeito, no mês de
 
fevereiro.
 
— Não se importe com isto; está entendido que, quando eu digo um mês, é um mês de trinta e um dias; os outros são meses aleijados, e não se contam.
 
— É isso mesmo, disse o velho rindo-se da minha idéia; assim como quem diz, um homem sem um braço. Ah!... ah!...
 
homem sem um braço. Ah!... ah!...
 
E continuou a rir-se, tomou o caminho de casa e desapareceu.
 
Quanto a mim, estava tão contente com a idéia de chegar à cidade em algumas horas, que não pude deixar também de rir-me do caráter original do pescador.
 
que não pude deixar também de rir-me do caráter original do pescador.
 
Conto-lhe estas cenas e as outras que se lhe seguiram com todas as suas circunstâncias por duas razões, minha prima.