Espumas Flutuantes (1913): diferenças entre revisões

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Linha 106:
*[[O Coração]]
*[[Murmúrios da Tarde]]
*[[Pelas sombras]]
<BR><b>&nbsp;</b>
*[[Ode ao Dous de Julho]]
<BR><b>&nbsp;</b>
*[[A duas flores]]
<BR><b>&nbsp;</b>
*[[O Tonel das Danaides]]
<br><b>Pelas Sombras </b>
*[[A Luís]]
<BR>&nbsp;
*[[Dalila]]
 
<BR>Ao Padre Francisco de Paula
<BR>&nbsp;
<BR>C'est que já suis frappé du doute
<BR>C'est que l'étoile de Ia foi
<BR>N'éclaire plus ma noire route:
<BR>Tout est abime autour de moil
 
<BR>LA MORVONNAIS
<BR>&nbsp;
<BR>Senhor! A noite é brava... a praia é toda escolhos.
 
<BR>Ladram na escuridão das Circes as cadelas...
<BR>As lívidas marés atiram, a meus olhos,
<BR>Cadáveres, que riem à face das estrelas!
 
<BR>Da garça do oceano as ensopadas penas
<BR>O mórbido suor enxugam-me da testa.
<BR>Na aresta do rochedo o pé se firma apenas...
<BR>No entanto ouço do abismo a rugidora festa!...
<BR>Nas orlas de meu manto o vendaval s'enrola...
<BR>Como invisível destra açoita as faces minhas...
 
<BR>Enquanto que eu tropeço... um grito ao longe rola...
 
<BR>"Quem foi?" perguntam rindo as solidões marinhas.
 
<BR>Senhor! Um facho ao menos empresta ao caminhante.
<BR>A treva me assoberba... O' Deus! dá-me um clarão!
<BR>E uma Voz respondeu nas sombras triunfante:
<BR>"Acende, ó Viajorl -o facho da Razão!"
 
<BR>Senhor! Ao pé do lar, na quietação, na calma
<BR>Pode a flama subir brilhante, loura, eterna;
<BR>Mas quando os vendavais, rugindo, passam n'alma,
<BR>Quem pode resguardar a trêmula lanterna?
<BR>Torcida... desgrenhada aos dedos da lufada
<BR>Bateu-me contra o rosto... e se abismou na
 
<BR>Eu vi-a vacilar... e minha mão queimada
<BR>&nbsp;
<BR>A lâmpada sem luz embalde ao raio eleva.
<BR>Quem fez a gruta - escura, o pirilampo cria!
<BR>Quem fez a noite-azul, inventa a estrela clara!
<BR>Na fronte do oceano- acende uma ardentia!
 
<BR>Com o floco do Santelmo - a tempestade aclara!
<BR>Mas ai! Que a treva interna - a dúvida constante -
 
<BR>Deixaste assoberbar-me em funda escuridão!...
<BR>E uma Voz respondeu nas sombras
triunfante:
<BR>"Acende, ó Viajor! a Fé no coração!..."
<BR><b>&nbsp;</b>
 
<BR><b>&nbsp;</b>
<BR><b>&nbsp;</b>
<br><b>Ode ao Dous de Julho </b>
<BR>&nbsp;
<BR>(Recitada no Teatro de S. Paulo)
<BR>&nbsp;
<BR>Era no dous de julho. A pugna imensa
 
<BR>Travara-se nos cerros da Bahia...
<BR>O anjo da morte pálido cosia
<BR>Uma vasta mortalha em Pirajá.
<BR>"Neste lençol tão largo, tão extenso,
<BR>"Como um pedaço roto do infinito...
<BR>O mundo perguntava erguendo um grito:
 
<BR>"Qual dos gigantes morto rolará?!..."
<BR>Debruçados do céu... a noite e os astros
<BR>Seguiam da peleja o incerto fado...
<BR>Era a tocha -o fuzil avermelhado!
<BR>Era o Circo de Roma-o vasto chão!
<BR>Por palmas-o troar da artilharia!
 
<BR>Por feras-os canhões negros rugiam!
<BR>Por atletas-dous povos se batiam!
<BR>Enorme anfiteatro - era a amplidão!
<BR>Não! Não eram dous povos, que abalavam
<BR>Naquele instante o solo ensangüentado...
<BR>Era o porvir-em frente do passado,
 
<BR>A Liberdade-em frente à Escravidão,
<BR>Era a luta das águias - e do abutre,
<BR>A revolta do pulso-contra os ferros,
<BR>O pugilato da razão - com os erros,
<BR>O duelo da treva-e do clarão!...
<BR>No entanto a luta recrescia indômita...
 
<BR>As bandeiras - como águias eriçadas -
<BR>Se abismavam com as asas desdobradas
<BR>Na selva escura da fumaça atroz...
<BR>Tonto de espanto, cego de metralha,
<BR>O arcanjo do triunfo vacilava...
<BR>E a glória desgrenhada acalentava
 
<BR>O cadáver sangrento dos heróis!...
<BR>Mas quando a branca estrela matutina
<BR>Surgiu do espaço... e as brisas forasteiras
<BR>No verde leque das gentis palmeiras
<BR>&nbsp;
<BR>Foram cantar os hinos do arrebol,
 
<BR>Lá do campo deserto da batalha Uma voz se elevou clara
e divina:
<BR>Eras tu- Liberdade peregrina!
<BR>Esposa do porvir-noiva do sol!...
<BR>Eras tu que, com os dedos ensopados
<BR>No sangue dos avós mortos na guerra,
<BR>Livre sagravas a Colúmbia terra,
 
<BR>Sagravas livre a nova geração!
<BR>Tu que erguias, subida na pirâmide,
<BR>Formada pelos mortos de Cabrito,
<BR>Um pedaço de gládio - no infinito...
<BR>Um trapo de bandeira - n'amplidão!...
<BR><b>&nbsp;</b>
 
<BR><b>&nbsp;</b>
<BR><b>&nbsp;</b>
<br><b>A Duas Flores </b>
<BR>&nbsp;
<BR>São duas flores unidas,
<BR>São duas rosas nascidas
<BR>Talvez no mesmo arrebol,
 
<BR>Vivendo no mesmo galho,
<BR>Da mesma gota de orvalho,
<BR>Do mesmo raio de sol.
<BR>Unidas, bem como as penas
<BR>Das duas asas pequenas
<BR>De um passarinho do céu...
 
<BR>Como um casal de rolinhas,
<BR>Como a tribo de andorinhas
<BR>Da tarde no frouxo véu.
<BR>Unidas, bem como os prantos,
<BR>Que em parelha descem tantos
<BR>Das profundezas do olhar...
 
<BR>Como o suspiro e o desgosto,
<BR>Como as covinhas do rosto,
<BR>Como as estrelas do mar.
<BR>Unidas... Ai quem pudera
<BR>Numa eterna primavera
<BR>Viver, qual vive esta flor.
 
<BR>Juntar as rosas da vida
<BR>Na rama verde e florida,
<BR>Na verde rama do amor!
<BR><b>&nbsp;</b>
<BR><b>&nbsp;</b>
<BR><b>&nbsp;</b>
<br><b>O Tonel das Danaides </b>
 
<BR>&nbsp;
<BR>Diálogo
<BR>&nbsp;
<BR>Na torrente caudal de seus cabelos negros
<BR>Alegre eu embarquei da vida a rubra flor.
<BR>-Poeta! Eras o Doge o anel lançando às ondas . . .
 
<BR>Ao fundo de um abismo... arremessaste c amor.
 
<BR>Depois minh'alma ao som da Lira de cem vozes
<BR>Sublimes fantasias em notas desfolhou.
<BR>&nbsp;
<BR>-Cleópatra também p'ra erguer no Tibre a espuma
<BR>As pér'las do colar nas vagas desfiou!
<BR>Depois fiz de meu verso a púrpura escarlate
 
<BR>Por onde ela pisasse em marcha triunfal!
<BR>-Como Hércules, volveste aos pos da insana Onfália
 
<BR>O fuso feminil de uma paixão fatal.
<BR>Um dia ela me disse: "Eu sou uma exilada!"
 
<BR>Ergui-me... e abandonei meu lar e meu país...
<BR>-Assim o filho pródigo atira as vestes quentes
 
<BR>E treme no caminho aos pés da meretriz.
<BR>E quando debrucei-me à beira daquela alma
<BR>P'ra ver toda riqueza e afetos que lhe dei! . . .
<BR>-Ai! nada mais achaste! o abismo 05 devorara...
<BR>O pego se esqueceu da dádiva do Rei!
<BR>Na gruta do chacal ao menos restam ossos...
 
<BR>Mas tudo sepultou-me aquele amor cruel!
<BR>-Poeta! O coração da fria Messalina
<BR>É das fatais Danaides o pérfido Tonel!
<BR><b>&nbsp;</b>
<BR><b>&nbsp;</b>
<BR><b>&nbsp;</b>
<br><b>A Luís </b>
 
<BR>&nbsp;
<BR>(No dia de seu Natalício)
<br>&nbsp;
<br>A imaginação, com O VOO ousado
 
<br>aspira a princípio à eternidade...
 
<br>Depois um pequeno espaço basta
em breve
<br>para os destroços de nossas
esperanças iludidas! . .
 
<BR>GOETHE
<BR>&nbsp;
<BR>Como um perfume de longínquas plagas
<BR>Traz o vento da pátria ao peregrino,
<BR>O meu amigo! que saudade infinda
<BR>Tu me trazes dos tempos de menino!
 
<br>É o ledo enxame de sutis abelhas
 
<br>Que vem lembrar à flor o mel
d'aurora...
<br>Acres perfumes de uma idade
ardente
<br>Quando o lábio sorri... mas
nunca chora!
<BR>Que tempos idos! que esperanças louras!
<BR>Que cismas de poesia e de futuro!
 
<BR>Nas páginas do triste Lamartine
<BR>Quanto sonho de amor pousava puro! ..
<BR>E tu falavas de um amor celeste,
<BR>De um anjo, que depois se fez esposa. . .
<BR>-Moça, que troca os risos de criança
<BR>&nbsp;
 
<BR>Pelo meigo cismar de mãe formosa.
<BR>Oh! meu amigo! neste doce instante
<BR>O vento do passado em mim suspira,
<BR>E minh'alma estremece de alegria,
<BR>Como ao beijo da noite geme a lira.
<BR>Tu paraste na tenda, ó peregrino!
 
<BR>Eu vou seguindo do deserto a trilha;
<BR>Pois bem... que a lira do poeta errante
<BR>Seja a bênção do lar e da família.
<BR><b>&nbsp;</b>
<BR><b>&nbsp;</b>
<BR><b>&nbsp;</b>
<br><b>Dalila </b>
 
<BR>&nbsp;
<BR>Fair defect of nature.
<BR>MILTON (Paradise Lost)
<BR>&nbsp;
<BR>Foi Desgraça meu Deus!... Não!... Foi loucura
<BR>Pedir seiba de vida-à sepultura,
<BR>Em gelo - me abrasar,
 
<BR>Pedir amores -a Marco sem brio,
<BR>E a rebolcar-me em leito imundo e frio
<BR>-A ventura buscar.
<BR>Errado viajor - sentei-me à alfombra
<BR>E adormeci da mancenilha à sombra
<BR>Em berço de cetim...
 
<BR>Embalava-me a brisa no meu leito...
<BR>Tinha o veneno a lacerar-me o peito
<BR>- A morte dentro em mim...
<BR>Foi loucura!... No ocaso -tomba o astro;
<BR>A estátua branca e pura de alabastro
<BR>- Se mancha em lodo vil...
 
<BR>Quem rouba a estrela-à tumba do ocidente?
<BR>Que Jordão lava na lustral corrente
<BR>O marmóreo perfil?...
<BR>Talvez!... Foi sonho!... Em noite nevoenta
<BR>Ela passou sozinha, macilenta,
<BR>Tremendo a soluçar...
 
<BR>Chorava - nenhum eco respondia...
<BR>Sorria-a tempestade além bramia...
<BR>E ela sempre a marchar.
<BR>E eu disse-lhe: Tens frio? - arde minha alma.
<BR>Tens os pés a sangrar?-podes em calma
<BR>Dormir no peito meu.
 
<BR>Pomba errante-é meu peito um ninho vago!
<BR>Estrela- tens minha alma-imenso lago-
<BR>Reflete o rosto teu! . . .
 
<BR>E amamos - Este amor foi um delírio...
<BR>Foi ela minha crença, foi meu lírio,
<BR>Minha estrela sem véu...
 
<BR>Seu nome era o meu canto de poesia,
<BR>&nbsp;
<BR>Que com o sol - pena de ouro -eu escrevia
<BR>Nas laminas do céu.
<BR>Em seu seio escondi-me... como à noite
<BR>Incauto colibri, temendo o açoite
 
<BR>Das iras do tufão,
<BR>A cabecinha esconde sob as asas,
<BR>Faz seu leito gentil por entre as gazas
<BR>Da rosa do Japão.
<BR>E depois... embalei-a com meus cantos
<BR>Seu passado esqueci... lavei com prantos
 
<BR>Seu lodo e maldição...
<BR>...Mas um dia acordei... E mal desperto
<BR>Olhei em torno a mim... -Tudo deserto...
<BR>Deserto o coração...
<BR>Ao vento, que gemia pelas franças
<BR>Por ela perguntei... de suas tranças
 
<BR>À flor que ela deixou...
<BR>Debalde... Seu lugar era vazio...
<BR>E meu lábio queimado e o peito frio,
<BR>Foi ela que o queimou...
<BR>Minha alma nodoou no ósculo imundo,
<BR>Bem como Satanás -beijando o mundo -
 
<BR>Manchou a criação,
<BR>Simum - crestou-me da esperança as flores...
<BR>Tormenta - ela afogou nos seus negrores
<BR>A luz da inspiração...
<BR>Vai, Dalila!... É bem longa
tua estrada...
<BR>É suave a descida-terminada
 
 
<BR>Em báratro cruel.
<BR>Tua vida-é um banho de ambrósia...
 
<BR>Mais tarde a morte e a lâmpada
sombria
<BR>Pendente do bordel.
<BR>Hoje flores... A música soando...
<BR>As perlas do Champagne gotejando
 
<BR>Em taças de cristal.
<BR>A volúpia a escaldar na lonca insônia...
<BR>Mas sufoca os festins de Babilônia
<BR>A legenda fatal.
<BR>Tens o seio de fogo e a alma fria.
<BR>O cetro empunhas lúbrico da orgia
 
<BR>Em que reinas tu só!...
<BR>Mas que finda o ranger de uma mortalha,
<BR>A enxada do coveiro que trabalha
<BR>A revolver o pó.
<BR>Não te maldigo, não!... Em vasto campo
<BR>Julguei-te - estrela, - e eras - pirilampo
 
<BR>Em meio à cerração...
<BR>Prometeu -quis dar luz à fria argila...
<BR>&nbsp;
<BR>Não pude... Pede a Deus, louca Dalila,
<BR>A luz da redenção!!...
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