Discurso da Casa Dividida: diferenças entre revisões

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O novo Presidente, também ele, aproveitou a recente ocasião da carta de Silliman sobre o endosso e interpretação da sentença, para expressar sua surpresa de que nenhum ponto de vista diverso jamais ter sido percebido.
 
Finalmente a disputa eclode entre o Presidente e o autor da Lei Nebraska, sobre uma mera questão de fato, sobre se a Constituição Lecompton<ref>A Constituição Lecompton foi a segunda de quatro propostas de Constituições para o estado do Kansas (foi precedida pela Constituição Topeka e seguida pelas Constituições Leavenworth e Wyandotte, tornando-se esta última a constituição do estado do Kansas), e preparada como uma resposta à proposta anterior. Era escravista, e recebeu o apoio do presidente Buchanan.</ref> era ou não, de qualquer forma, feita pelo povo do Kansas; e nesta disputa mais tarde ele declara que tudo o que pretende é que haja uma votação justa pelo povo, e que ele não se importa se a escravidão será mantida ou derrubada. Eu não entendo a sua declaração, significando que ele não se importa se a escravidão será ou não abolida, mas sim que ele entenda seja uma definição apta para a política que pretende imprimir sobre a opinião pública - o princípio que ele declara é que já sofreu muito, e que está pronto para sofrer até o fim.
 
E desta forma pode ele apegar-se a esse princípio. Se ele tem algum sentimento parental, então pode ele se apegar a isto. Esse princípio, é só uma migalha da sua doutrina Nebraska original. Nos termos da Decisão Dred Scott, "soberania de joelhos" ajoelhada para fora da existência, desmanchando-se tal qual um palanque temporário - tal qual um molde de fundição que volta a ser areia solta - ajudou a vencer a eleição, e depois foi largada aos ventos. Sua luta final junto aos republicanos<ref>O Partido Republicano, ao qual Lincoln pertencia, foi fundado pelos abolicionistas conservadores dos estados nortistas</ref>, contra a Constituição Lecompton, nada mais traz da doutrina Nebraska original. Esta luta foi feita por um só ponto, o direito de o povo fazer sua própria constituição, e no qual ele e os republicanos não têm divergido.
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Isto vem jogar luz sobre o último ponto, ao qual retorno, e leva a mente sobre a sequência dos fatos históricos aos quais já me referi. Muitas coisas agora já parecem menos obscuras e misteriosas do que quando eles estavam segredando. As pessoas iriam ficar "perfeitamente livres", sujeitas somente à Constituição. O que a Constituição tinha a ver com isto, era os que estavam de fora não podiam compreender. Está tudo claro agora, tudo foi exatamente feito para montar um nicho, onde depois se encaixou a Decisão Dred Scott, a declarar que ser perfeitamente livre é a liberdade do povo de justamente não ter liberdade para todos. Por que a emenda, declarando expressamente o direito do povo, não foi votada? Tudo ficou perfeitamente claro agora: a adoção disto teria estragado o nicho no qual se encaixou a Decisão Dred Scott. Por que a decisão judicial foi adiada? Por que até mesmo a opinião individual de um Senador foi adiada, para depois da eleição presidencial? Está tudo claro agora - se tivessem falado antes, teriam prejudicado o argumento do perfeitamente livre em que a eleição foi conduzida. Por que adiaram a felicitação presidencial sobre o endosso? Por que a demora em uma réplica? Por que a demora do Presidente na sua exortação em favor da decisão? Essa coisa se parece com o cuidadoso bate e alisa<ref>No original, um trocadilho forma essa expressão: ''patting and petting''</ref> que se faz num cavalo indomado, antes de montá-lo, quando se teme que ele venha a derrubar o cavaleiro. E por que tudo foi precipitado logo em seguida ao endosso da decisão, pelo Presidente e pelos demais?
 
Nunca saberemos com absoluta certeza se todas esses acertos foram exatamente o resultado de combinações prévias. Mas quando vemos um monte de vigas ajustadas, partes distintas que sabemos terem sido obtidas em momentos e lugares diversos, e por trabalhadores diferentes - Stephen<ref>Stephen A. Douglas (1813-1861), Senador democrata (escravista, portanto) pelo estado de Illinois - quando derrotou a Lincoln, foi derrotado por este nas eleições presidenciais de 1860. Ardoroso defensor da Decisão Dred Scott, contudo foi graças a ele que a Constituição Lecompton fora derrubada, numa divisão entre os democratas do Norte e os do Sul.</ref>, Franklin<ref>Franklin Pierce (1804–1869), 14º Presidente dos EUA entre 1853 a 1857</ref>, Roger<ref>Roger, neste caso: o Chefe de Justiça Roger B. Taney, que foi o redator do Caso Dred Scott</ref>, e James<ref>James Buchanan, Jr. (1791–1868), 15º Presidente dos EUA.</ref> para ilustrarmos um exemplo - quando vemos todas as vigas juntas, logo percebemos que elas formam a estrutura de uma casa ou de um moinho, com todas as cavilhas e malhetes se encaixando perfeitamente, com todas as medidas e proporções das peças angulares<ref>No original: ''L pieces''</ref> perfeitamente adaptadas para seus lugares, sem nenhuma peça maior ou menor - sem esquecer até mesmo dos andaimes - ou, se uma simples peça estiver faltando, ainda assim veremos que o quadro já estará perfeitamente montado e preparado para receber esta peça - em qualquer hipótese achamos impossível deixar de acreditar que Stephen e Franklin e James e Roger não tenham combinado uns com os outros desde o início, e que não trabalharam conforme um plano comum ou de acordo com um projeto elaborado antes do primeiro golpe ser desferido.
 
Não se deve esquecer que, até a Lei Nebraska, o povo de um Estado, bem como de um Território, foram deixados "perfeitamente livres", "sujeitos apenas à Constituição". Por que então falaram nos Estados? Eles estavam legislando para os Territórios, e não para os Estados. Certamente o povo de um Estado é e deve estar sujeito à Constituição dos Estados Unidos; mas por que uma menção tão pesada<ref>No original: ''this lugged'', verbo que denota carregar algum peso, ou que o peso carregado é excessivo e, também, em náutica, carregar excessivamente as velas de um navio. Optou-se pela tradução livre)</ref> no bojo de uma lei meramente Territorial? Por que o povo de um Território e o povo de um Estado foram ali agrupados, e sua relação em face da Constituição tratada como sendo exatamente a mesma coisa? Embora o parecer da Corte, pelo Chefe de Justiça Taney, no caso Dred Scott, e em todos os pareceres em separado dos juízes concordantes, expressamente declare que a Constituição dos Estados Unidos não permite que o Congresso nem o legislador Territorial possam excluir a escravidão em qualquer Território dos Estados Unidos, todos eles foram omissos em declarar se a mesma Constituição permite ou não ao Estado, ou o povo de um Estado, excluir a servidão. Possivelmente isto foi uma simples omissão; mas quem pode ter mesmo certeza, se McLean ou Curtis<ref>NT: John McLean e Benjamin R. Curtis foram os dois únicos juízes da Corte Suprema que votaram contra na Decisão Dred Scott</ref> tenham tentado inserir na ementa uma declaração de poder ilimitado ao povo de um Estado para excluir a escravidão de seus limites, assim como Chase e Mace<ref>NT: Salmon P. Chase foi um dos fundadores do "''Anti-Nebraska Party''", que questionava a aplicação do Ato de Kansas-Nebraska, redigido pelo senador Douglas (já mencionado aqui) em 1954. Não foi possível encontrar maiores informes sobre a atuação do parlamentar democrata por Indiana, Daniel Mace.</ref> procuraram obter uma declaração, em nome do povo de um Território, no texto do Ato de Nebraska - Eu pergunto, quem pode assegurar que não teria sido rejeitada, quer num caso como em outro? A abordagem mais aproximada do ponto que declara o poder de um Estado sobre escravidão é a feita pelo Juiz Nelson<ref>NT: Samuel Nelson, juiz da Suprema Corte, foi um dos que votaram a favor no Caso Dred Scott</ref>. Ele se aproxima por mais de uma vez, usando uma ideia mais precisa, e quase a mesma linguagem, também, do Ato de Nebraska.<ref>NT: Embora Lincoln refira-se várias vezes como "''Nebraska Act''", ou mesmo "''Nebraska Bill''", o acordo passou à história como Ato de Kansas-Nebraska. Como se pode ver numa nota anterior, contudo, entre os contemporâneos não se mencionava o Kansas; acreditamos que tal ocorra porque ambos os atuais estados compunham, à época, um só território.</ref>Em uma ocasião sua linguagem exata é, "exceto nos caso em que o poder é restringido pela Constituição dos Estados Unidos a lei do Estado é suprema sobre o tema da escravidão sob a sua jurisdição." Em quais casos o poder do Estado é tão reprimido pela Constituição dos Estados Unidos, é algo deixado em aberto, precisamente na mesma questão, como na contenção dos poderes dos Territórios, em que foi deixada em aberto pela Ato de Nebraska. Colocando isto e aquilo juntos, e teremos outro pouco agradável nicho que não demoraremos a ver sendo preenchido por outras decisões da Corte Suprema declarando que a Constituição dos Estados Unidos não permitem aos Estados excluírem a servidão dentro de seus limites. Isto pode ser especialmente esperado se a doutrina do "não cuido se a escravidão será abolida ou não em alguma votação" for imbuída na opinião pública suficientemente a ponto de garantir que esta decisão seja mantida como foi feita.