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|obra=[[No País dos Ianques]]
|autor=Adolfo Caminha
▲|seção=Capítulo XIII
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Toda nova, toda alegre e pitoresca, sem os bairros imundos que o Tâmisa lambe com as suas águas pútridas, onde bóiam cadáveres em decomposição, iluminada por um sol que dá vida e conforta, a nova Londres tem um cunho especial de cidade latina. Como em Londres, tudo nela é grandioso e opulento, desde a edificação igual, sólida e elegante, até às festividades públicas e às instituições nacionais.
As ruas, longas e direitas, cruzam-se geometricamente e distinguem-se pela numeração ''(Fourteen street, Fifteen street ''etc.).
A Broadway é o centro comercial, a rua de maior movimento quotidiano
Aí é que os carros se atropelam, que os transeuntes se abalroam numa confusão burlesca e indescritível de que a nossa Rua do Ouvidor não dá sequer a menor idéia. Negociantes, capitalistas, banqueiros, corretores, operários e vagabundos acotovelam-se, empurram-se, pisam-se os calos e vão seguindo adiante, sem olhar pra trás, carregados de embrulhos, suando no verão, que costuma ser muito forte em Nova
Um cosmopolitismo sem igual em parte alguma.
Americanos, ingleses, espanhóis, franceses, italianos, alemães, gente de todas as nacionalidades, até turcos com os seus costumes esquisitos, confundem-se nas ruas de Nova Iorque, enchendo-as em ondas sucessivas e tumultuosas, como em dias de carnaval no Rio. Parece mesmo, à primeira vista, que o elemento estrangeiro absorve o nacional, tão numeroso é aquele. Custa, porém, a encontrar-se um português ou um brasileiro. Em compensação a raça latina é abundantemente representada por espanhóis da Europa e da América. Os mexicanos, apesar da natural e oculta ojeriza que têm aos americanos dos Estados Unidos, encontram-se a cada passo e distinguem-se logo pelo seu tipo original: estatura média, rosto anguloso
Uma das coisas mais curiosas de Nova Iorque são os trens elevados ''(elevated railroad), ''a complicada rede de linhas férreas que rodeia a cidade passando em muitos pontos por cima da casaria, atravessando ruas inteiras sobre grandes colunas resistentes de ferro. Partem todas da Battrey Square, ponto mais meridional da ilha de Manhattan (onde fica a cidade) e vão terminar na sua extremidade setentrional, em Harlem River. Segundo o relatório apresentado pela ''New York Elevated, ''o número de viajantes transportados em 1878 por essa linha foi de 107.079.625. (Sempre a estatística como base fundamental do progresso entre os americanos!) A linha inteira, que tem seguramente trinta milhas, estava concluída até Harlem. Os moradores das margens dessas estradas de ferro aéreas queixavam-se continuamente da vizinhança.
Pudera! Ruído, fumo e fagulhas a toda hora sobre a cabeça, não são coisas que agradem a ninguém. A pobre gente fica em risco de perder o juízo, pois não!
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Felizmente, o que aliás é muito admirável, os desastres reproduzem-se raríssimas vezes. É que o serviço faz-se com inexcedível perfeição e as posturas municipais verificam-se inexoravelmente.
As estações são numeradas, como as ruas: ''Primeira Estação, Segunda Estação, ''etc.
Os passageiros desembarcam em plataformas de ferro gradeadas, que comunicam com as estações.
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O espírito inventivo dos americanos revela-se a cada passo nas grandes cidades dos Estados Unidos. Em todos os estabelecimentos, em todos os ramos da atividade pública se encontra uma aplicação nova de mecânica industrial, um artifício de utilidade prática, econômico e curioso, uma invenção engenhosa...
Aproveitar o tempo e economizar os dólares
Um domingo em Coney Island: nada mais pitoresco e hilariante, nada mais sugestivo...
Coney Island aos domingos é para os americanos o que o Bois é para os franceses e Hyde Park é para os ingleses
Essa pequena ilha constitui a principal diversão domingueira dos habitantes de Nova Iorque.
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Famílias inteiras, burgueses de todas as castas, cocotes, afluem para ali nesses dias. Pela manhã, cedo, largam da Falton Station grandes barcas embandeiradas conduzindo músicas, cheias de passageiros. Muita gente prefere ir por terra, em trens que partem de Brooklin.
Não há lugar para todos nos hotéis. Improvisam-se piqueniques defronte do mar, na beira da praia, formam-se pagodeiras, e muitas pessoas há que não se lembram de comer
Vimos dois grandes hotéis
Aquele é um magnífico estabelecimento, todo construído de madeira de lei sobre enorme plataforma que se move em trilhos próprios. Novo gênero de hotéis até então desconhecido para nós. Num dado momento podem ser conduzidos, como qualquer ''tramway, ''dum lugar para outro.
O ''Gigantic Elephant (the monarch
Quer num, quer noutro, o ''promeneur ''encontra abundante variedade de petiscos e bebidas.
As crianças, com especialidade, fazem de Coney Island um céu aberto. Elas, sim, não perdem os cavalinhos que andam à roda ao som de um clássico realejo seboso, os passeios aéreos, na ponte-russa, nas barquinhas, nos trens elevados...
Por toda a parte música, realejos, pregoeiros de coisas maravilhosas'', ''gritos, gargalhadas...
Tiram-se retratos instantâneos, apostam-se corridas, sobem-se elevadores de duzentos metros acima do solo, pesca-se, alugam-se cavalos de passeio... Enfim, Coney Island é uma miniatura da vida tumultuosa das grandes cidades.
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O pobre-diabo que não for esperto e econômico arrisca-se a voltar com as algibeiras cheias de vento...
À noite enchem-se novamente os trens e as barcas. Em uns e outros a algazarra torna-se insuportável. Canta-se a ''Marselhesa ''em vozes detestáveis, grita-se, bate-se com a ponteira da bengala no chão, assovia-se, imitam-se animais de toda a espécie... Uma loucura!
Entretanto, abençoado país! em todas essas pagoderias não se distingue sequer um boné policial. Não há conflitos, nem desastres.
Tudo corre na maior harmonia, sem intervenção da guarda cívica. Os ''policemen ''podem cochilar à vontade: a população americana é naturalmente pacata e respeitadora da ordem.
Coney Island é o complemento necessário e indispensável de Nova Iorque.
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Pelo verão reúnem-se ali cerca de 5.000 pessoas, segundo o cálculo aproximado do cônsul brasileiro.
Dias depois da nossa chegada, o ''Barroso ''entrou para o dique de Brooklin, a fim de sofrer alguns reparos no casco.
Enquanto isto se dava, enquanto a guarnição ocupava-se da limpeza externa do cruzador, com o cuidado, com o desvelo e com o carinho mesmo de amigos dedicados, íamos visitando outras cidades americanas, ligeiramente, de relance.
Não nos foi dado, porém, diga-se em parêntesis, ver o mais grandioso espetáculo dos Estados Unidos
Não tivemos mesmo a felicidade de ver Washington, a bonita capital americana, e tampouco o presidente Cleveland.
Esse privilégio coube quase que exclusivamente. ao ex-príncipe
Sua Alteza não era para que digamos muito amigo da natureza e menos ainda de personagens ilustres.
Quanto a mim continuei a ver a famosa cascata por um óculo, nos livros do poeta, e o
Assim, contentamo-nos com visitar algumas cidades de importância e tão depressa que era impossível apanhar com precisão todos os caracteres por meio dos quais se pode apreciar a vida de uma população.
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Vejamos:
BALTIMORE
A gente de Baltimore parece viver uma vida tranqüila e descuidada no calmo interior de seu ''home, ''longe da mentira social, longe de todo o ruído, beatificamente, numa paz invejável, respirando uma atmosfera livre do micróbio daninho das civilizações tumultuosas.
Baltimore é uma cidade por excelência aristocrática e higiênica, onde os temperamentos requintadamente pacíficos encontrariam o desejado repouso trespassado da incomparável doçura de um clima raro.
Na melhor de suas praças e no mais elevado de seus pontos ergue-se a
Para subir até essa galeria fui obrigado a vencer duzentos degraus (contados) de uma estreita escadaria de pedra, em espiral. De cima vê-se, a olho nu, todo o panorama, realmente belo, da cidade, que lembra uma dessas paisagens holandesas, muito claras e sugestivas, tais como descreve Ramalho Ortigão, e onde destacam, num fundo de aquarela, linhas de arvoredo e revérberos
Ouvi dizer algures que as mulheres mais bonitas dos Estados Unidos são as de Baltimore. Durante as poucas horas que aí nos demoramos vimos alguns rostos femininos na verdade encantadores. É possível que víssemos com olhos protetores de hóspedes em terra estranha...
Era nosso cônsul naquela cidade Fontoura Xavier, o conhecido autor das ''Opalas, ''bom poeta e péssimo republicano, que se apressou em nos proporcionar todas as comodidades possíveis, franqueando-nos os quartos e os salões do melhor hotel do lugar. Fez mais: ofereceu gentilmente à oficialidade brasileira um delicadíssimo almoço ao qual compareceram diversos estudantes nossos patrícios.
Guardamos belas recordações de Baltimore.
FILADELFIA — Grande centro de indústria e comércio. Altas chaminés características. Céu encoberto de fumaça, pesado e lúgubre a certas horas do dia. Aquedutos, casas colossais, ruas largas e atulhadas de barricas e caixotes. Continuo movimento de carros e tramways. Imensa e grandiosa, a cidade vista de qualquer ponto elevado. A lembrança que fica é a de um grande edifício em construção, cheio de rumor de máquinas e de operários em atividade permanente.▼
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Não há tempo a perder. Temos apenas três horas a nossa disposição, pois que o trem deve partir para Anápolis às cinco da tarde e já são duas...
Leio na tabuleta de um bonde: ''Zoological Garden... ''Oh! sim, vamos ao Jardim Zoológico, a mais completa coleção de animais, que já se conseguiu formar. O meu companheiro, que conhece o Jardim Zoológico de Londres e o de Filadélfia, opta por este. Vejo, de passagem ruas belíssimas, esplêndidas filas de casas luxuosas, magníficos jardins particulares, templos em estilo gótico; descampados...
Mas, a viagem é longa, o tempo escorre sem a gente perceber, e é preciso contar com a volta, a fim de apanhar o trem.
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Mal tivemos tempo de chegar, embarafustar por entre os passageiros que se acumulavam na gare, e saltar para dentro do vagão.
E eu fiz o resto da viagem pensando no assombroso progresso daquela cidade enorme, que ainda em 1791 não era mais que uma simples colônia a respeito da qual Chateaubriand exprimia-se deste modo:
Não foi preciso mais de um século para que os americanos fizessem dela uma das principais cidades industriais do mundo.
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O que será a grande cidade americana daqui a cem anos?
[[Categoria:No País dos Ianques|Capítulo 13]]
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