Encarnação (José de Alencar)/II: diferenças entre revisões

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}}[[Categoria:Encarnação (José de Alencar)|Capítulo 02]]
 
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Na chácara contígua à do Sr. Veiga, pelo lado esquerdo, morava um desses homens que o povo designa com o nome de esquisitos.
 
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Todavia nas raras vezes em que soava a grossa campa da entrada, aparecia logo um velho criado, todo vestido de preto, que introduzia a visita com uma cortesia respeitosa mas fria e taciturna.
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O dono da casa costumava ir à cidade três vezes na semana, para tratar de seus negócios, ou talvez para não se isolar totalmente do mundo de que já vivia tão apartado. Também saia de passeio, a pé ou a cavalo pelos arrabaldes.
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Estas alternativas sucediam-se por fases; duravam semanas e meses. A fisionomia denunciava logo a conjunção desse espírito com o mundo. Havia nele, como em todos nós, dois homens, o íntimo e o social; a diferença é que nele as duas faces revezavam-se, enquanto que nos outros elas de ordinário são fixas e formam o direito e o avesso do indivíduo.
 
Ainda mesmo nos seus dias de misantropia o
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semblante do Sr. Hermano era tão modesto e sereno que ninguém via na sua desatenção orgulho ou falta de civilidade.
 
Atribuíam estas desigualdades de caráter ao gênio e não se ofendiam com elas. Em geral os vizinhos e conhecidos o saudavam sempre cordialmente, embora ele passasse sem olhá-los.
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Um dia, no meio de seus triunfos, quando a sua estrela mais brilhava, correu a noticia de que Hermano estava para casar-se, o que não devia surpreender em sua idade. Foi, porém, geral a admiração quando se soube que D. Julieta, a moça por quem se apaixonara a ponto de sacrificar-lhe a liberdade. não era rica nem bonita.
 
Ninguém esperava que ele, nas condições de pretender as filhas dos primeiros capitalistas e de
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escolher entre as mais aristocráticas belezas da corte, fizesse um casamento tão desvantajoso.
 
D. Julieta não freqüentava a alta sociedade; mas algumas pessoas da creme' a tinham encontrado por vezes em partidas familiares; e essas compreenderam a repentina que ela tinha inspirado ao noivo.
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O espírito fino, meigo e gentil de Julieta não tinha expansões brilhantes. Era modesto, e às vezes tímido. Entretanto o que ela dela por mais simples que fosse, trazia o calor de uma emoção intima. Sua palavra exalava os perfumes de uma alma em flor.
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Ao seu lado e conversando com ela, um homem de rigor estético poderia esquivar-se ao enlevo que infundia a suprema distinção dessa moça, e notar em suas feições e em seu talhe a ausência da beleza plástica
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Quando entrou no saguão, cantava uma senhora a ária da Lúcia de Lammemor. A voz, que não era extensa, comoveu-o. Parou para escutar; e viu desenhar-se em seu espírito a imagem esbelta e vaporosa da virgem que o amor enlouquecera.
 
Terminado o canto, subiu. Havia na sala muitas senhoras algumas de seu conhecimento, outras que via pela primeira vez. Notou entre estas uma moça alva, de cabelos negros; era Julieta. Sem que lho dissessem, por uma rápida intuição adivinhou que fora ela a intérprete
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inspirada da música de Donizetti.
 
Teve pois uma decepção Ele imaginara sempre uma Lúcia loura como a filha das nevoentas montanhas da Escócia; e vinha achar a sua cópia em um tipo tão oposto.
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Foi pois o furriel Abreu que serviu de ama-seca a menina, e tal amizade tomou-lhe que não quis mais separar-se dela. Completando o tempo de serviço obteve baixa e ficou em companhia do oficial agregado
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Hermano freqüentou a casa do coronel Soares. Pouco mais de mês depois do seu primeiro encontro com Julieta manifestou-lhe os seus sentimentos, que aliás já eram conhecidos da moça, e pediu-lhe um consentimento, que tinha razão de esperar.
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— Compreendi todo o seu pensamento, Julieta. e não imagina o meu júbilo por encontrar tão perfeita identidade de sentimentos na mulher a quem amo. Sempre acreditei que o casamento não deve ser uma simples união social, mas a formação da alma criadora e mãe, da alma perfeita, de que nós não somos senão as parcelas esparsas. Essa alma uma vez formada, só Deus a pode dividir e mutilar.
 
O casamento realizou-se pouco tempo depois; e
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os noivos foram morar na casa de São Clemente, a qual tinha sido preparada com esmero para recebê-los.
 
Abreu acompanhou sua filha de criação. Ele a tinha recebido em seus braços ao nascer, e contava não deixá-la senão quando Deus o chamasse.