O Coruja/III/XII: diferenças entre revisões

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Sem resumo de edição
 
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Sem imaginação, nem talento inventivo e nem arte, André só assim encontrou meio de usar da sua grande atividade intelectual e foi aos poucos se familiarizando com os estudos econômicos e sociológicos.
 
Pode ser que esse apetite fosse ainda uma conseqüênciaconsequência da sua idéia fixa e dominante - a história do Brasil, obra esta a que ele se escravizara desde os seus vinte anos e da qual nunca se distraíra investigando sempre, inalteravelmente, com a calma e a paciência de um sábio velho que se dedica ao trabalho só pelo prazer de trabalhar, sem a menor preocupação de elogio ou glória. Essa obra ainda estava longe de seu termo, mas representava já uma soma enorme de serviço: compilações de todo o gênero e apontamentos de toda a espécie.
 
— Se eu não conseguir levá-la ao cabo, dizia ele., aí fica bom material para quem o souber aproveitar, dando-lhe a forma literária, que é só o que lhe falta.
 
E isto que ele dizia a respeito da carcassa da sua obra capital, verificou-se logo com os seus apontamentos sobre questões sociais: um dia Teobaldo fez-lhe algumas perguntas a respeito de elemento servil, locação de serviços e colonização. Coruja satisfez as perguntas do amigo e declarou que tinha consigo algumas notas tomadas nesse sentido.
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— Ora! a forma literária é o menos. Isso arranja-se brincando.
 
— Pois se quiseres arranjá-la...
 
— Homem! Está dito! Publicam-se com um pseudônimo. Vais ver o barulhão que isto faz aí!
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— São minhas! resumiu Teobaldo, guardando na algibeira as notas do Coruja.
 
Daí a dias surgia em público o primeiro artigo dos de uma longa série que então se publicaram e que estavam destinados a dar ao marido de Branca uma nova reputação, uma reputação que ele ainda não tinha: - a de homem de bom senso prático e econômico.
 
As conscienciosas notas de André, floreadas pelas lantejoulas da retórica do outro, converteram-se no objeto da curiosidade pública.
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Podia enfim alargar os seus horizontes e desejar mais largos apesar do seu espírito ser tão inconstante e a sua ambição tão desnorteada.
 
Agora já não pensava mais em se fazer dono e redator de um jornal; vivia só para uma idéiaideia: entrar na câmara dos deputados.
 
Um terrível contratempo veio, porém, alterar-lhe a vida.
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E chegando-se para ela, acrescentou em voz baixa:
 
— E que não faria eu por sua causa? Terei porventura alguma outra preocupação que não seja tornar--me aos seus olhos cada vez mais digno? Terei maior ambição do que vê-la satisfeita comigo e perdoando-me o estimá-la mais do que me é permitido... E tanto assim que nada mais lhe peço além de declarar com franqueza o que quer que eu faça; ordene e ver-me-á submisso e escravo a seus pés cumprindo as suas leis.
 
— Não tenho ordens para lhe dar, nem direito para isso, apenas desejo que meu primo continue a ser meu amigo, e, visto que não está nas mesmas circunstâncias em que eu estou para com Teobaldo, perdoe-lhe as franquezas e as maldades.
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— Não o compreendo e peço licença para retirar-me, sinto-me indisposta; meu marido não tarda aí e far-lhe-á companhia.
 
Branca afastou-se tranqüilamentetranquilamente, sem se mostrar nem de leve receosa das seduções do primo; ao passo que este, sufocando a sua impaciência, deixou-se ficar imóvel no lugar em que estava, a fitá-la pelas costas com o seu comprido olhar de homem teimoso e vingativo.
 
Que pensará de mim esta mulher? interrogou ele intimamente, cruzando os braços no meio da sala. - Que idéia fará da minha vontade e do meu querer? Pois não perceberá ela que eu, odiando o marido, não faria por este o menor sacrifício, se não fora a esperança de saciar o amor que me põe louco? É impossível que Branca, tão inteligente e tão lúcida, não me compreenda e não perceba as minhas intenções! É impossível que ela me suponha tão fácil de contentar que eu só exija de sua pessoa um casto e fraternal reconhecimento! Ah! mas agora, agora que os tenho seguros por uma dívida de meia dúzia de contos de réis, hei de chegar aos fins a que desejo ou muito terão eles de amargar!
 
Fazia tais reflexões, quando Teobaldo entrou da rua.
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O feitiço vira-se às vezes contra o feiticeiro: tu, que tens destelhado a valer a honra de vários maridos, estás agora com a tua exposta à chuva e aos ventos... Olha que lhe fazem cada rombo, que até da rua a gente os vê!...
 
E a graça, adorável Teobaldo, é que deves esse obséquio ao teu melhor amigo, ao teu intimoíntimo, ao teu unha com carne! Coitado do meu Teobaldo!
 
Se exiges provas do que dizemos, estamos dispostos a dar-tas quando quiseres."