O Corvo (tradução de Machado de Assis): diferenças entre revisões

Conteúdo apagado Conteúdo adicionado
Sem resumo de edição
desfazendo correção (preciso cobrar no bugzilla sobre a mensagem de sistema); convertendo para a forma <poem>
Linha 1:
{{navegar
{{navegar|obra=[[O Corvo]]|autor=Edgar Allan Poe|notas=Tradução de [[Autor:Machado de Assis|Machado de Assis]]}}
|obra=[[O Corvo]]
|autor=Edgar Allan Poe
|notas=Tradução de [[Autor:Machado de Assis|Machado de Assis]]
}}
<poem>
Em certo dia, à hora, à hora
Da meia-noite que apavora,
Eu, caindo de sono e exausto de fadiga,
Ao pé de muita lauda antiga,
De uma velha doutrina agora morta,
Ia pensando, quando ouvi à porta
Do meu quarto um soar devagarinho
E disse estas tais palavras:
"É alguém que me bate à porta de mansinho;
Há de ser isso e nada mais."
 
Ah! bem me lembro! bem me lembro!
:Em certo dia, à hora, à hora
Era no glacial dezembro;
:Da meia-noite que apavora,
Cada brasa do lar sobre o colchão refletia
:Eu, caindo de sono e exausto de fadiga,
A sua última agonia.
:Ao pé de muita lauda antiga,
Eu ansioso pelo Sol, buscava
:De uma velha doutrina agora morta,
Sacar daqueles livros que estudava
:Ia pensando, quando ouvi à porta
Repouso (em vão!) à dor esmagadora
:Do meu quarto um soar devagarinho
Destas saudades imortais
:E disse estas palavras tais:
Pela que ora nos céus anjos chamam Lenora,
:"É alguém que me bate à porta de mansinho;
:HáE deque serninguém isso e nadachamará mais."
 
E o rumor triste, vago, brando
:Ah! bem me lembro! bem me lembro!
Das cortinas ia acordando
:Era no glacial dezembro;
Dentro em meu coração um rumor não sabido,
:Cada brasa do lar sobre o colchão refletia
Nunca por ele padecido.
:A sua última agonia.
Enfim, por aplacá-lo aqui, no peito,
:Eu ansioso pelo Sol, buscava
Levantei-me de pronto, e "Com efeito,
:Sacar daqueles livros que estudava
(Disse) é visita amiga e retardada
:Repouso (em vão!) à dor esmagadora
Que bate a estas horas tais.
:Destas saudades imortais
É visita que pede à minha porta entrada:
:Pela que ora nos céus anjos chamam Lenora,
:E quede ninguémser chamaráisso e nada mais."
 
Minh'alma então sentiu-se forte;
:E o rumor triste, vago, brando
Não mais vacilo, e desta sorte
:Das cortinas ia acordando
Falo: "Imploro de vós - ou senhor ou senhora,
:Dentro em meu coração um rumor não sabido,
Me desculpeis tanta demora.
:Nunca por ele padecido.
Mas como eu, precisando de descanso
:Enfim, por aplacá-lo aqui, no peito,
Já cochilava, e tão de manso e manso,
:Levantei-me de pronto, e "Com efeito,
Batestes, não fui logo, prestemente,
:(Disse) é visita amiga e retardada
Certificar-me que aí estais."
:Que bate a estas horas tais.
Disse; a porta escancaro, acho a noite somente,
:É visita que pede à minha porta entrada:
:Hásomente dea ser issonoite, e nada mais."
 
Com longo olhar escruto a sombra
:Minh'alma então sentiu-se forte;
Que me amedronta, que me assombra.
:Não mais vacilo, e desta sorte
E sonho o que nenhum mortal há já sonhado,
:Falo: "Imploro de vós - ou senhor ou senhora,
Mas o silêncio amplo e calado,
:Me desculpeis tanta demora.
Calado fica; a quietação quieta;
:Mas como eu, precisando de descanso
:Já cochilavatu, e tão depalavra mansoúnica e mansodileta,
Lenora, tu, como um suspiro escasso,
:Batestes, não fui logo, prestemente,
Da minha triste boca sais;
:Certificar-me que aí estais."
E o eco, que te ouviu, murmurou-te no espaço;
:Disse; a porta escancaro, acho a noite somente,
:somenteFoi aisso noiteapenas, e nada mais.
 
Entro co'a alma incendiada.
:Com longo olhar escruto a sombra
Logo depois outra pancada
:Que me amedronta, que me assombra.
Soa um pouco mais forte; eu, voltando-me a ela:
:E sonho o que nenhum mortal há já sonhado,
"Seguramente, há na janela
:Mas o silêncio amplo e calado,
Alguma coisa que sussurra. Abramos,
:Calado fica; a quietação quieta;
Eia, fora o temor, eia, vejamos
:Só tu, palavra única e dileta,
A explicação do caso misterioso
:Lenora, tu, como um suspiro escasso,
Dessas duas pancadas tais,
:Da minha triste boca sais;
Devolvamos a paz ao coração medroso,
:E o eco, que te ouviu, murmurou-te no espaço;
:FoiObra issodo apenasvento, e nada mais."
 
Abro a janela, e de repente,
:Entro co'a alma incendiada.
Vejo tumultuosamente
:Logo depois outra pancada
Um nobre corvo entrar, digno de antigos dias.
:Soa um pouco mais forte; eu, voltando-me a ela:
Não despendeu em cortesias
:"Seguramente, há na janela
Um minuto, um instante. Tinha o aspecto
:Alguma coisa que sussurra. Abramos,
de um lord ou de uma lady. E pronto e reto,
:Eia, fora o temor, eia, vejamos
Movendo no ar as suas negras alas,
:A explicação do caso misterioso
Acima voa dos portais,
:Dessas duas pancadas tais,
Trepa, no alto da porta em um busto de Palas:
:Devolvamos a paz ao coração medroso,
:ObraTrepado do ventofica, e nada mais."
 
Diante da ave feia e escura,
:Abro a janela, e de repente,
Naquela rígida postura,
:Vejo tumultuosamente
Com o gosto severo, - o triste pensamento
:Um nobre corvo entrar, digno de antigos dias.
Sorriu-me ali por um momento,
:Não despendeu em cortesias
E eu disse: "Ó tu que das noturnas plagas
:Um minuto, um instante. Tinha o aspecto
Vens, embora a cabeça nua tragas,
:de um lord ou de uma lady. E pronto e reto,
Sem topete, não és ave medrosa,
:Movendo no ar as suas negras alas,
Dize os teus nomes senhoriais;
:Acima voa dos portais,
Como te chamas tu na grande noite umbrosa?"
:Trepa, no alto da porta em um busto de Palas:
:TrepadoE fica,o ecorvo disse: nada"Nunca mais."
 
Vendo que o pássaro entendia
:Diante da ave feia e escura,
A pergunta que eu lhe fazia,
:Naquela rígida postura,
Fico atônito, embora a resposta que dera
:Com o gosto severo, - o triste pensamento
Dificilmente lha entendera.
:Sorriu-me ali por um momento,
Na verdade, jamais homem há visto
:E eu disse: "Ó tu que das noturnas plagas
Coisa na terra semelhante a isto:
:Vens, embora a cabeça nua tragas,
Uma ave negra, friamente posta
:Sem topete, não és ave medrosa,
Num busto, acima dos portais,
:Dize os teus nomes senhoriais;
Ouvir uma pergunta a dizer em resposta
:Como te chamas tu na grande noite umbrosa?"
:EQue oeste corvoé disseseu nome: "Nunca mais."
 
No entanto, o corvo solitário
:Vendo que o pássaro entendia
Não teve outro vocabulário.
:A pergunta que eu lhe fazia,
Como se essa palavra escassa que ali disse
:Fico atônito, embora a resposta que dera
Toda sua alma resumisse,
:Dificilmente lha entendera.
Nenhuma outra proferiu, nenhuma.
:Na verdade, jamais homem há visto
Não chegou a mexer uma só pluma,
:Coisa na terra semelhante a isto:
Até que eu murmurei: "Perdi outrora
:Uma ave negra, friamente posta
"Tantos amigos tão leais!
:Num busto, acima dos portais,
"Perderei também este em regressando a aurora."
:Ouvir uma pergunta a dizer em resposta
:QueE esteo écorvo seu nomedisse: "Nunca mais."
 
Estremeço. A resposta ouvida
:No entanto, o corvo solitário
É tão exata! é tão cabida!
:Não teve outro vocabulário.
"Certamente, digo eu, essa é toda a ciência
:Como se essa palavra escassa que ali disse
Que ele trouxe da convivência
:Toda sua alma resumisse,
De algum mestre infeliz e acabrunhado
:Nenhuma outra proferiu, nenhuma.
Que o implacável destino há castigado
:Não chegou a mexer uma só pluma,
Tão tenaz, tão sem pausa, nem fadiga,
:Até que eu murmurei: "Perdi outrora
Que dos seus cantos usuais
:"Tantos amigos tão leais!
Só lhe ficou, na amarga e última cantiga,
:"Perderei também este em regressando a aurora."
:EEsse o corvo disseestribilho: "Nunca mais."
 
Segunda vez nesse momento
:Estremeço. A resposta ouvida
Sorriu-me o triste pensamento;
:É tão exata! é tão cabida!
Vou sentar-me defronte ao corvo magro e rudo;
:"Certamente, digo eu, essa é toda a ciência
E, mergulhando no veludo
:Que ele trouxe da convivência
Da poltrona que eu mesmo ali trouxera,
:De algum mestre infeliz e acabrunhado
Achar procuro a lúgubre quimera,
:Que o implacável destino há castigado
A alma, o sentido, o pávido segredo
:Tão tenaz, tão sem pausa, nem fadiga,
Daquelas sílabas fatais,
:Que dos seus cantos usuais
Entender o que quis dizer a ave do medo
:Só lhe ficou, na amarga e última cantiga,
:EsseGrasnando estribilhoa frase: "Nunca mais."
 
Assim posto, devaneando,
:Segunda vez nesse momento
Meditando, conjeturando,
:Sorriu-me o triste pensamento;
Não lhe falava mais; mas, se lhe não falava,
:Vou sentar-me defronte ao corvo magro e rudo;
Sentia o olhar que me abrasava.
:E, mergulhando no veludo
Conjeturando fui, tranqüilo, a gosto,
:Da poltrona que eu mesmo ali trouxera,
Com a cabeça no macio encosto
:Achar procuro a lúgubre quimera,
Onde os raios da lâmpada caíam,
:A alma, o sentido, o pávido segredo
Onde as tranças angelicais
:Daquelas sílabas fatais,
De outra cabeça outrora ali se desparziam
:Entender o que quis dizer a ave do medo
:GrasnandoE aagora frase:não "Nuncase esparzem mais."
 
Supus então que o ar, mais denso,
:Assim posto, devaneando,
Todo se enchia de um incenso,
:Meditando, conjeturando,
Obra de serafins que, pelo chão roçando
:Não lhe falava mais; mas, se lhe não falava,
Do quarto, estavam meneando
:Sentia o olhar que me abrasava.
Um ligeiro turíbulo invisível:
:Conjeturando fui, tranqüilo, a gosto,
E eu exclamei então: "Um Deus sensível
:Com a cabeça no macio encosto
Manda repouso à dor que te devora
:Onde os raios da lâmpada caíam,
Destas saudades imortais.
:Onde as tranças angelicais
Eia, esquece, eia, olvida essa extinta Lenora."
:De outra cabeça outrora ali se desparziam
:E agorao nãocorvo sedisse: esparzem"Nunca mais."
 
"Profeta, ou o que quer que sejas!
:Supus então que o ar, mais denso,
Ave ou demônio que negrejas!
:Todo se enchia de um incenso,
Profeta sempre, escuta: Ou venhas tu do inferno
:Obra de serafins que, pelo chão roçando
Onde reside o mal eterno,
:Do quarto, estavam meneando
Ou simplesmente náufrago escapado
:Um ligeiro turíbulo invisível:
Venhas do temporal que te há lançado
:E eu exclamei então: "Um Deus sensível
Nesta casa onde o Horror, o Horror profundo
:Manda repouso à dor que te devora
Tem os seus lares triunfais,
:Destas saudades imortais.
Dize-me: existe acaso um bálsamo no mundo?"
:Eia, esquece, eia, olvida essa extinta Lenora."
:E o corvo disse: "Nunca mais."
 
:"Profeta, ou o que quer que sejas!
:Ave ou demônio que negrejas!
:Profeta sempre, escuta:, Ouatende, venhas tu doescuta, infernoatende!
Por esse céu que além se estende,
:Onde reside o mal eterno,
Pelo Deus que ambos adoramos, fala,
:Ou simplesmente náufrago escapado
Dize a esta alma se é dado inda escutá-la
:Venhas do temporal que te há lançado
No Éden celeste a virgem que ela chora
:Nesta casa onde o Horror, o Horror profundo
Nestes retiros sepulcrais,
:Tem os seus lares triunfais,
"Essa que ora nos céus anjos chamam Lenora!"
:Dize-me: existe acaso um bálsamo no mundo?"
:E o corvo disse: "Nunca mais."
 
:"Profeta,Ave ou odemônio que quer que sejasnegrejas!
:AveProfeta, ou demônioo que negrejasquer que sejas!
Cessa, ai, cessa! (clamei, levantando-me) cessa!
:Profeta sempre, escuta, atende, escuta, atende!
Regressando ao temporal, regressa
:Por esse céu que além se estende,
À tua noite, deixa-me comigo...
:Pelo Deus que ambos adoramos, fala,
Vai-te, não fique no meu casto abrigo
:Dize a esta alma se é dado inda escutá-la
Pluma que lembre essa mentira tua.
:No Éden celeste a virgem que ela chora
Tira-me ao peito essas fatais
:Nestes retiros sepulcrais,
:"EssaGarras que oraabrindo nosvão céusa anjosminha chamamdor Lenora!já crua."
:E o corvo disse: "Nunca mais."
 
E o corvo aí fica; ei-lo trepado
:"Ave ou demônio que negrejas!
No branco mármore lavrado
:Profeta, ou o que quer que sejas!
Da antiga Palas; ei-lo imutável, ferrenho.
:Cessa, ai, cessa! (clamei, levantando-me) cessa!
Parece, ao ver-lhe o duro cenho,
:Regressando ao temporal, regressa
Um demônio sonhando. A luz caída
:À tua noite, deixa-me comigo...
Do lampião sobre a ave aborrecida
:Vai-te, não fique no meu casto abrigo
No chão espraia a triste sombra; e fora
:Pluma que lembre essa mentira tua.
Daquelas linhas funerais
:Tira-me ao peito essas fatais
:GarrasQue queflutuam abrindono vãochão, a minha doralma que crua."chora
:ENão osai corvomais, disse:nunca, "Nuncanunca mais." !
</poem>
 
[[Categoria:Edgar Allan Poe]]
:E o corvo aí fica; ei-lo trepado
[[Categoria:Machado de Assis]]
:No branco mármore lavrado
:Da antiga Palas; ei-lo imutável, ferrenho.
:Parece, ao ver-lhe o duro cenho,
:Um demônio sonhando. A luz caída
:Do lampião sobre a ave aborrecida
:No chão espraia a triste sombra; e fora
:Daquelas linhas funerais
:Que flutuam no chão, a minha alma que chora
:Não sai mais, nunca, nunca mais!
 
::[[Edgar Allan Poe]]
 
[[categoria:Edgar Allan Poe]]
[[categoria:Machado de Assis]]
[[Categoria:Poesia estado-unidense]]
[[categoriaCategoria:Romantismo estado-unidense]]
[[Categoria:traduções]]