Em Tradução:Cândido/Capítulo 1: diferenças entre revisões

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A senhora baronesa, que pesava cerca de trezentas & cinquenta libras, atraía para lá uma consideração grandíssima & fazia as honras da casa com uma dignidade que a tornava ainda mais respeitável. Sua filha Cunegundes, de dezessete anos, era corada, fresca, gorda, apetecível. O filho do barão parecia em tudo digno de seu pai. O preceptor Pangloss era o oráculo da casa, & o pequeno Cândido escutava suas lições com toda a boa fé de sua idade & de seu caráter.
 
Pangloss ensinava metafísico-teólogo-cosmolonigologia. Ele provou admiravelmente que não há efeito algum sem causa & que, neste melhor dos mundos possíveis, o castelo do senhor barão era o mais bonitobelo dos castelos, & a senhora, a melhor das baronesas possíveis.
 
Está demonstrado, dizia ele, que as coisas não podem ser outramente: porquanto tudo é feito para um fim, tudo é necessariamente para o melhor fim. Remarca bem que os narizes foram feitos para portar óculos, por isso temos óculos. As pernas são visivelmente instituídas para ser calçadas, & temos calças. As pedras foram feitas para ser talhadas & para fazer castelos; por isso o monsenhor tem um castelo muito lindobonito; o maior barão da província deve ser o melhor alojado: & os porcos são feitos para ser manjados, manjamos porco o ano todo: por conseguinte, os que avançaram que tudo está bem disseram uma estultice: é preciso dizer que tudo está ao melhor.
 
Cândido ouvia atentamente & cria inocentemente; que achava Senhorita Cunegundes belíssimalindíssima, conquanto nunca teve o atrevimento de lho dizer. Concluía que, após a felicidade de ser nascido barão de Thunder-ten-tronckh, o segundo grau de felicidade era ser Senhorita Cunegundes, o terceiro, de ad’a ver todos os dias & o quarto, d’entender Mestre Pangloss, o maior filósofo da província &, por conseguinte, de toda a terra.
 
Um dia Cunegundes, ao passear perto do castelo, no pequeno bosque que se apelava de parque, viu entre arbustos o doutor Pangloss, que dava uma lição de física experimental à camareira de sua mãe, moreninha muito joliz & muito dócil. Como Senhorita Cunegundes tinha muita disposição para as ciências, observou, sem suflar, as experiências reiteradas de que foi testemunha; viu claramente a razão suficiente do doutor, os efeitos & as causas: & retornou toda agitada, toda pensativa, toda repleta do desejo de ser sábia; sonhando que poderia bem ser a razão suficiente do jovem Cândido, que podia outrossim ser a sua.
 
Ela reencontrou Cândido em revinda ao castelo & se enrubesceu; Cândido se enrubesceu também; disse-lhe bom-dia com uma voz entrecortada, & Cândido lhe falou sem saber o que ele dizia. No dia seguinte, depois do jantar, como se saía da mesa, Cunegundes & Cândido se encontraram atrás dum para-vento; Cunegundes deixou tombar seu lenço, Cândido o apanhou, ela lhe pegou inocentemente na mão, o jovem beijou inocentemente a mão da jovem donzela com uma vivacidade, uma ternura, uma graça, todas particulares; suas bocas se encontraram, seus olhos se inflamaram, seus joelhos tremeram, suas mãos se extraviaram. O senhor barão de Thunder-ten-tronckh passou ao lado do para-vento &, vendo aquela causa & aquele efeito, expulsou Cândido do castelo a grandes pontapés no traseiro; Cunegundes desvaneceu; foi soprada pela senhora baronesa desde que voltoufoi voltada a si, & tudo ficou consternado no mais bonitobelo & mais agradável dos castelos possíveis.}}