O Coruja/III/IX: diferenças entre revisões

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Leonília, logo em seguida àquela célebre visita que lhe fez o Coruja, isto é, logo que embolsou o dinheiro que ele lhe levou, fez vir o Aguiar à presença dela e lhe disse:
 
— Sabes? Resolvi largar de mão o casamento de Teobaldo e parto no primeiro paquete que daqui sair.
 
— Pois tu vais deixar o Rio de Janeiro em semelhante ocasião? perguntou o rapaz, sinceramente espantado; vais partir sofrendo em silêncio o que acaba de te fazer aquele miserável?
 
— É verdade.
 
— Pois nem ao menos procuras vingar-te?
 
— Oh! quanto a isso, mais devagar, meu amigo!
 
— Ah!...
 
— Era preciso que eu não o tivesse amado apaixonadamente e não me tivesse abaixado até à última humilhação a que conduz o amor, para não guardar contra ele um ódio terrível e uma terrível necessidade de fazer-lhe mal.
 
— Bom.
 
— Mas, por enquanto, não quero. Seria tolice. Ele que se case, que siga o seu destino; mais tarde hei de estar ao seu lado.
 
Aguiar tentou ainda convencê-la de que a melhor coisa a fazer contra Teobaldo era desmanchar-lhe o casamento; nada, porém, conseguiu e pôs à disposição dela o seu auxílio.
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Interrogou o Aguiar sobre esse ponto, e o Aguiar respondeu jurando que a prima era um modelo de honestidade conjugal.
 
— Bom, disse Leonília, é o que vamos ver...
 
E esperou.
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Foi assim que ela, na tal noite da entrevista da mulher do conselheiro, viu o Aguiar surgir na porta de Teobaldo com a mulher deste pelo braço.
 
— Olé! disse consigo e, auxiliada pela escuridão, pode observá-los à vontade, sem ser pressentida.
 
Viu-os trocarem em segredo algumas palavras, depois meterem-se resolutamente rio carro que os esperava na rua e que tomou logo a direção da cidade. Leonília acompanhou-os, recomendando ao seu cocheiro de guardá-los a certa distância e não os perder de vista.
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O primo de Branca estava longe de se supor espiado, e não procurou esconder a sua contrariedade defronte de Leonília.
 
— Mas com que diabólica intenção fizeste semelhante coisa? perguntou ele, depois de ouvir da cortesã a confissão de que ela o seguira desde Botafogo.
 
— Ora essa! respondeu Leonília, sem dominar o seu contentamento, para vingar-me, está claro! Quero que repitas agora o que disseste da inquebrantável honestidade de tua prima!
 
— Pois olha, juro-te que não mentiria sustentando o que afirmei a respeito dela.
 
— Tem graça!
 
— Não posso te explicar as circunstâncias muito especiais, que determinaram o que acabas de ver, mas afianço-te que Branca tem sido até hoje uma esposa verdadeiramente casta..
 
— Ora deixa-te disso, e fala com franqueza.
 
— Mas, filha, juro-te que estou dizendo a verdade. As aparências muitas vezes enganam.
 
— Bem! Não queres falar, tanto pior para ti... Outros descobrirão aquilo que não me queres confessar.
 
— Mas se não há nada!
 
— Não tratemos mais disto; acabou-se!
 
— Não! Mas é que tu me podes comprometer muito seriamente...
 
— Pois se tens medo de mim, fala com franqueza e eu farei as coisas de modo a não ficares comprometido. Não admito é que me queiras convencer a mim, de que levas a estas horas uma mulher à tua casa de rapaz solteiro, talvez para discutirem algum ponto de moral doméstica!... Isso, hás de ter paciência, mas não passa... E, por conseguinte, dize lá o que entenderes, mas desde já te previno de que tenho sobre o fato o meu juízo formado.
 
— Se tens já o teu juízo formado, para que diabo queres então que eu fale?
 
— Porque com isso não fico sabendo menos do que já sei.
 
— E se eu não quiser falar?
 
— Nesse caso darei parte desta entrevista a Teobaldo; e ele que proceda como entender.
 
— E como conseguirias provar?
 
— Ora! Isso seria o menos! Bastava-me o cocheiro, que é meu conhecido antigo; e demais não sabes se eu estou só; posso ter testemunhas.
 
— Mas que diabo lucras tu com a minha confissão?
 
— Não é disso que se trata! Quero saber é se confessas ou não confessas que és o amante de tua prima?
 
— Desde que afianças que, se eu não confessar, vais perde-la para sempre... Confesso!
 
— Confessas então que és o amante da mulher de Teobaldo?
 
— Que remédio!
 
— E há quanto tempo?
 
— Desde que a conheço. Bem sabes que ela é a única mulher que amei até hoje...
 
— Não! Pergunto desde quando ela é a tua amante de fato, desde quando a possuís!
 
— Não sei, já não me lembro.
 
— E que tencionas fazer?
 
— A que respeito?
 
— A respeito dela. Pergunto se tencionas continuar como até agora, ou visto que a amas, se tens a intenção de tirá-la do marido.
 
— Isso não é coisa que preciso que ela consentisse.
 
— Ela não quer?
 
— Creio que não.
 
— Não lhe perguntaste?
 
— Nunca.
 
— Não creio.
 
Ele sacudiu os ombros.
 
— Bem... murmurou Leonília, depois de uma pausa. - Adeus.
 
— Posso então confiar em ti, não é verdade? perguntou Aguiar, apertando-lhe a mão.
 
— Podes confiar abertamente. Adeus.
 
— Até outra vez.
 
Leonília afastou-se, tomou o seu carro e desapareceu. Aguiar, muito contrariado com o que acabava de suceder, foi-se deixando ir pelas ruas, procurando consolar-se com a idéia que ainda havia de possuir como amante aquela que o rejeitou para marido.
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E, já sentado à mesa do hotel, onde ele costumava cear, dizia de si para si enquanto esperava o chá:
 
— No fim de contas fui muito feliz em não me ter casado com ela!
 
[[Categoria:O Coruja|Terceira Parte, Capítulo 09]]