Eu (Augusto dos Anjos, 1912)/Idealismo

Idealismo


Falas de amor, e eu ouço tudo e calo!
O amor na Humanidade é uma mentira.
E’. E é por isto que na minha lyra
De amores futeis poucas vezes falo.

O amor! Quando virei por fim a amal-o?!
Quando, si o amor que a Humanidade inspira
E’ o amor do sybarita e da hetaïra,
De Messalina e de Sardanapálo?!

Pois é mister que, para o amor sagrado,
O mundo fique immaterialisado
— Alavanca desviada do seu fulcro —

E haja só amizade verdadeira
Duma caveira para outra caveira,
Do meu sepulchro para o teu sepulchro?!