José Bonifácio (Machado de Assis)

De tantos olhos que o brilhante lume
Viram do sol amortecer no ocaso,
Quantos verão nas orlas do horizonte
         Resplandecer a aurora?

Inúmeras, no mar da eternidade,
As gerações humanas vão caindo;
Sobre elas vai lançando o esquecimento
         A pesada mortalha.

Da agitação estéril em que as forças
Consumiram da vida, raro apenas
Um eco chega aos séculos remotos,
         E o mesmo tempo o apaga.

Vivos transmite a popular memória
O gênio criador e a sã virtude,
Os que o pátrio torrão honrar souberam,
         E honrar a espécie humana.

Vivo irás tu, egrégio e nobre Andrada!
Tu, cujo nome, entre os que à pátria deram
O batismo da amada independência,
         Perpetuamente fulge.

O engenho, as forças, o saber, a vida
Tu votaste à liberdade nossa,
Que a teus olhos nasceu, e que teus olhos
Inconcussa deixaram.

Nunca interesse vil manchou teu nome,
Nem abjetas paixões; teu peito ilustre
Na viva chama ardeu que os homens leva
         Ao sacrifício honrado.

Se teus restos há muito que repousam
No pó comum das gerações extintas,
A pátria livre que legaste aos netos
         E te venera e ama,

Nem a face mortal consente à morte
Que te roube, e no bronze redivivo
O austero vulto restitui aos olhos
         Das vindouras idades.

“Vede (lhes diz) o cidadão que teve
Larga parte no largo monumento
Da liberdade, a cujo seio os povos
         Do Brasil te acolheram.

Pode o tempo varrer, um dia, ao longe,
A fábrica robusta; mas os nomes
Dos que o fundaram viverão eternos,
         E viverás, Andrada!”