As primaveras (1925)/Primaveras/Livro Primeiro/Meus oito annos

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Meus oito annos

Oh! souvenirs! printemps! aurores!
V. HUGO.

Oh! que saudades que tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infancia querida
Que os annos não trazem mais!
Que amor, que sonhos, que flôres,
N’aquellas tardes fagueiras
A’ sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjaes!

Como são bellos os dias
Do despontar da existencia!
— Respira a alma innocencia
Como perfumes a flôr;
O mar é — lago sereno,
O céo — um manto azulado,
O mundo — um sonho dourado,
A vida — um hymno d’amor!

Que aurora, que sol, que vida,
Que noites de melodia
N’aquella dôce alegria,
N’aquelle ingênuo folgar!
O céo bordado d’estrellas,
A terra de aromas cheia,
As ondas beijando a areia
E a lua beijando o mar!

Oh! dias da minha infancia!
Oh! meu céo de primavera!
Que doce a vida não era
N’essa risonha manhã!
Em vez das mágoas de agora,
Eu tinha n’essas delicias
De minha mãe as caricias
E beijos de minha irmã!

Livre filho das montanhas,
Eu ia bem satisfeito,
Da camisa aberto o peito,
— Pés descalços, braços nús —
Correndo pelas campinas
A’ roda das cachoeiras,
Atraz das azas ligeiras
Das borboletas azues!

N’aquelles tempos ditosos
Ia colher as pitangas,
Trepava a tirar as mangas,
Brincava á beira do mar;
Resava ás Ave-Marias,
Achava o céo sempre lindo,
Adormecia sorrindo
E despertava a cantar!

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Oh! que saudades que tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infancia querida
Que os annos não trazem mais!
— Que amor, que sonhos, que flôres,
N’aquellas tardes fagueiras
A’ sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjaes!


Lisboa — 1857.