O Subterrâneo do Morro do Castelo/Domingo, 28 de maio de 1905

Os Achados dos Subterrâneos editar

O Crucifixo de Ouro e o Candieiro de Ferro editar

O Sr. Rodrigues Alves, logo ao saber do encontro do crucifixo de ouro, numa das galerias do morro do Castelo, foi pronunciando o venha a nós e chamando aos peitos o objeto achado pelo Dr. Dutra. Por seu lado, o Dr. Frontin, que para estas coisas não é mole, foi se apossando do candieiro de ferro, encontrado na sala abobadada.

A seguirem as coisas, para o futuro, o mesmo rumo, e dado o caso de aparecer o S. Inácio de Loiola ou qualquer dos apóstolos, claro está que aqueles dois senhores se julgarão com o direito de carregá-los.

Que isso é torto como qualquer das galerias não pode haver a menor dúvida: tudo o que ali dentro possa estar guardado e que na opinião do Sr. Léo Junius representa riquezas fabulosas, pertence de direito ao povo, único soberano — em doutrina e em imagem de retórica, é verdade.

Qualquer cidadão tem tanto direito ao crucifixo e ao candieiro como os srs. Rodrigues Alves ou Frontin.

Ora, como é impossível dividir os objetos em partes iguais pelos milhões de almas que habitam o país — do Amazonas ao Prata e do Rio Grande ao Pará — ficam eles sendo de propriedade de todos em geral, sem ser de cada um em particular.

Todo cidadão pode apreciá-los de longe, com a vista unicamente.

Ninguém afirmará, agora, que nos lugares onde se acham atualmente possam os objetos ser admirados pelo povo. Além de ser um pouco cacete, pela formalidade, entrar no Palácio de Friburgo, não há tolo nenhum que acredite ser o Sr. Rodrigues Alves capaz de mostrar o crucifixo a quem deseje vê-lo.

Sendo assim, qual deve ser a conclusão a tirar? Simplesmente esta: tanto o crucifixo como o candieiro devem estar em determinado ponto, para serem apreciados pelos seus legítimos donos, e isto em dias marcados pelos encarregados da guarda de tais objetos e que nada mais são que representantes dos supraditos donos.

Podiam eles ficar na Gávea, na Tijuca, no Saco do Alferes ou em Santa Teresa, mas isso já dependeria de despesas com pessoal, instalação, etc.

Há, porém, uma casa mantida exatamente para guardar semelhantes objetos: é o Museu Nacional.

Por que não mandaram para lá o crucifixo e o candieiro?

Então o Sr. Rodrigues Alves ou o Dr. Frontin, numa terra em que todos são iguais, podem se apossar de objetos encontrados em terrenos do Estado e encontrados quando se faziam escavações por conta desse mesmo Estado?

Se assim é, mandemos plantar batatas a tal igualdade, porque nenhum deles é melhor do que qualquer homem do povo, único pagante dos trabalhos feitos no morro do Castelo.

Vamos lá, Sr. Rodrigues Alves e Dr. Frontin, entreguem ao Museu Nacional o que lhes não pertence: isto aqui não é, positivamente, a casa da mãe Joana.