Erica Foerthmann Schultz; Márcia Janete Espig | 15

diversos olhares sobre um texto escrito por um alemão rememorando o então já distante ano de 1887, a visão idealizada dos imigrantes alemães sobre um país desconhecido e o olhar crítico que nós brasileiros lançamos a semelhantes descrições.

As memórias de Helling não têm um caráter épico, não enaltecem heróis que desbravaram uma terra incógnita. São antes uma fonte de entretenimento, com elementos de livros de aventuras que fazem lembrar obras de literatura infanto-juvenil. Pode-se observar a ironia com que Helling descreve nossas paragens e tipos humanos da época. Há facetas que podem escapar ao leitor brasileiro e são de difícil transmissão em um texto traduzido. Citemos como exemplo a frase constante na página 16 da obra alemã: "Era no belo mês de maio, mas este mês de encantos é, no planalto do sul do Brasil, um frio dos diabos." Der wunderschöne Monat Mai, mês da primavera no continente europeu, é referência frequente na poesia do Romantismo alemão e a alusão a um poema de Heine é habilmente rompida com seu complemento verdammt kalt (um frio dos diabos). Referências literárias são comuns no texto e sua remissão nem sempre é acessível ao leitor de língua portuguesa, menos familiarizado com a literatura alemã: "Eu involuntariamente precisei me lembrar do poema sobre o 'Mergulhador' de Schiller quando vi estes valentes cavaleiros e escudeiros parados em volta sem coragem de entrar no abismo." [1] Resta aos tradutores o recurso à nota explicativa no rodapé.

Em certos trechos, Helling busca reproduzir variações linguísticas da língua alemã, ou seja, os chamados "dialetos". No primeiro capítulo, são observados momentos de tentativa de transcrição da fala berlinense e da fala da região de Holstein, no norte da Alemanha. Em dialeto berlinense encontramos:

1.Dreckwasser und hinten een bisschen Jejend - p.11

2.Na, Helling, biste de ooch hier? - p. 11

 

  1. HELLING, Robert. 40 Jahre im Innern von Brasilien; Erlebnisse eines Eisenbahningenieurs, von Robert Helling. Berlin, Pyramidenverlag, Dr. Schwarz & Co., [1931]. p. 51.