88 | 40 anos no interior do Brasil: aventuras de um engenheiro ferroviário

continuavam em sono profundo e chegou ileso até ao seu catre, onde caiu exausto e dormiu quase a manhã inteira.

No dia seguinte perguntou casualmente o que, afinal, ia acontecer com ele. O chefe respondeu secamente: “Por enquanto eu também não sei; mas mandei um mensageiro ao santo que deve voltar daqui a dois dias, e então veremos.”

“Mas o que é que pode acontecer comigo? Afinal de contas, eu não fiz mal a ninguém!”

“Isso não tem importância, pois nós só cumprimos as ordens do santo.”

“E o que é que ele costuma ordenar?”

“Depende do que o anjo lhe diz e aí só tem duas alternativas: Ou você será considerado digno de nos acompanhar e participar na nossa luta, ou o santo ordena que você seja fuzilado em seguida! Mas isso executamos rapidamente, sem que sintas muita dor.”

Dito isso, o chefe deu as costas. O velho sentiu uma forte tontura. Agora gostaria de ter fugido toda a distância que seus velhos pés teriam conseguido andar. Derrotado atirou-se ao seu catre, mas durante a noite não conseguiu encontrar a coragem de realizar sua fuga. Na manhã seguinte trouxeram um touro para ser abatido; o animal estava furioso e, portanto, foi segurado por dois laços. Havia pouca gente no acampamento. Lentamente e em silêncio o chefe aproximou-se com o facão para desferir-lhe o golpe mortal; sua vítima, porém, constantemente mudou de posição, e quando finalmente decidiu esfaqueá-la, falhou em partir a aorta, fazendo o animal agonizante pular para a frente, berrando e atirando ao chão as pessoas que seguravam os laços. Num instante atravessou a praça deserta e desapareceu no mato, arrastando os laços atrás de si.

Segundos depois todos os homens estavam correndo atrás dele, e de repente o velho se viu sozinho no acampamento. Olhou em volta, controlando todas as barracas. Não havia nenhum movimento. Mas espera aí - que cabeça era essa lá na beira do mato? Será que é um homem? “Não”, exclamou feliz da vida, “é uma mula!”