A ILUSTRE CASA DE RAMIRES
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ou enxadas — e ainda colhiam o Casco na estrada, o malhavam como uma espiga.

Ao pé do gallinheiro, sentindo uma risada fina de rapariga, atravessou o pateo para a porta alumiada da cosinha. Dois moços da horta, a filha da Crispola, a Rosa, tagarellavam, regaladamente sentados n’um banco de pedra, sob a fresca escuridão da latada. Dentro o lume estrallejava — e a panella do caldo, fervendo, rescendia. Toda a colera do Fidalgo rompeu:

— Então, que sarau é este? Vocês não me ouviram chamar?... Pois encontrei lá em baixo, ao pé do pinheiral, um bebedo, que me não conheceu, veiu para mim com uma foice!... Felizmente levava a bengala. E chamo, grito... Qual! Tudo aqui de palestra, e a ceia a cozer! Que desaforo! Outra vez que succeda, todos para a rua... E quem resmungar, a cacete!

A sua face chammejava, alta e valente. A pequena da Crispola logo se escapulira, encolhida, para o recanto da cosinha, para traz da maceira. Os dois moços, erguidos, vergavam como duas espigas sob um grande vento. E emquanto a Rosa, aterrada, se benzia, se derretia em lamentações sobre «desgraças que assim s’armam!» — Gonçalo, deleitado pela submissão dos dois homens, ambos tão rijos, com tão grossos varapaus encostados á parede, amansava:

— Realmente! sois todos surdos, n’esta pobre casa!...