A ILUSTRE CASA DE RAMIRES
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pela rasteira mexeriquice das Lousadas!... Certesa tão humilhadora não apagaria um sentimento — que se não apagava com humilhações mais intimas, tanto mais dolorosas. Mas estimularia a sua reserva e o seu desconfiado recato: — e agora que André se afastára para Lisboa, operaria n’ella, surdamente, solitariamente, sem que a presença tentadora lhe desmanchasse a influencia socegadora e salutar. Assim o torpe papel aproveitava a Gracinha como um aviso temeroso pregado na parede. E rancorosamente preparada pelas duas femeas para desencadear nos Cunhaes escandalo e dôr — talvez restabelecesse, na ameaçada casa, quietação e gravidade. — Gonçalo esfregou as mãos pensando — que em tão ditosa manhã talvez até esse mal redundasse em bem!

— Oh Bento, onde está a Snr. aD. Graça?

— A menina subiu agora ha pouco para o seu quarto, Snr. Doutor.

Era o seu quarto de solteira, claro e fresco sobre o pomar, onde ainda se conservava o seu leito de linda madeira embutida, um toucador illustre que pertencera á Rainha D. Maria Francisca de Saboya, e o sophá, as cadeiras de casimira clara em que Gracinha bordára, n’um arrastado labor d’annos, o Açor negro dos Ramires. E sempre que voltava á Torre Gracinha gostava de reviver no seu quarto, as horas de solteira, remexendo as gavetas,