472
A ILUSTRE CASA DE RAMIRES

rei D. Fernando, se erguia n’aquella beira d’agua, uma castellania famosa! Vêde além! — E mostrava na ponta do pego, fronteira ao barranco, dous rijos pilares de pedra, que emergiam da agua negra, e que chuva e vento polira como marmores finos. Um passadiço de traves, sobre estacas limosas e meio apodrecidas, atava a margem ao mais grosso dos pilares. E a meio d’esse rude esteio pendia uma argola de ferro.

No emtanto já o tropel da peonagem se espalhára pela ribanceira. D. Garcia Viegas desmontou, bradando por Pero Ermigues, o Coudel dos bésteiros de Santa Ireneia. E, ao lado do ginete de Tructesindo, risonho e gozando a surpreza, ordenou ao Coudel que seis dos seus rijos homens descessem o Bastardo da mula, o estirassem no chão, o despissem, todo nú, como sua mãe barregã o soltára á negra vida...

Tructesindo encarou o Sabedor, franzindo as sobrancelhas hirsutas:

— Por Deus, D. Garcia! que me ides simplesmente afogar o villão, e sujar essa agua innocente!...

E alguns Cavalleiros, em redor, murmuraram tambem contra morte tão quieta e sem malicia. Mas os miudos olhos de D. Garcia giravam, lampejavam de triumpho e gosto:

— Socegae, socegae! Velho estou certamente, mas ainda o senhor Deus me consente algumas traças.