213

e o brilhantismo das imagens nos não afagam os sentidos, recusamos demorar a vista; e escapa-nos assim na sombra muita belleza real, ás vezes occulta sob a grosseira revestidura da poesia ou narrativa popular.

É necessario que passe o enthusiasmo, a violencia da paixão nascente, que venha a frieza de animo necessaria á imparcialidade do juizo, para que nos não cause repulsão a aspereza, e grosseria até, da fórma e consigamos apreciar o bello que por ventura n’ella se envolva.

Dá-se com a belleza da ideia e da fórma de qualquer obra litteraria, o que se dá com a belleza moral e a belleza physica de uma mulher.

Ambas são feitas para nos commoverem e dominarem. Mas, quando o assomar de um sentir novo começa a alvoroçar o sangue do adolescente, quando fórmas vagas e formosissimas principiam a encantar-lhe os sonhos de suas noites febris, a paixão da fórma domina-o; por ella sacrifica tudo; uma modelação perfeita, um delineamento gracioso poderá decidir da sua vida inteira, e na fascinação que o cega, nunca verá a formosura da alma, que se abriga n’uma pouco feliz encarnação. É que para apreciar a belleza moral, para a vêr transparecer, através do involucro exterior é preciso deixar passar a vertigem dos primeiros momentos, ou não a ter ainda experimentado.

Por isso na infancia e nas idades viris é que melhor se apreciam essas fealdades, que escondem um coração angelico. A adolescencia é impiamente cruel para com ellas.

Por uma lei analoga é o povo, o simile da creança, porque não tem os sentidos educados para as mais subtis bellezas da fórma, e é o homem a quem ella já não fascina, embora ainda e sempre o deleite, como poderosissimo elemento de belleza litteraria, — são estes os leitores que mais aptos estão para avaliarem uma ou outra inspiração que, entre