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— Poesia não lhe pode elle dar, agora se... alguns versos o satisfazem...

— Sim, sim, venham os versos; que a poesia eu a procurarei n’elles, até a achar. Desde já lh’os agradeço.

— A elle?

— A ambos — respondeu Angelo, rindo. — E agora diga-me, Augusto: Ainda está resolvido a viver aqui sempre enterrado? Não pensa em mudar de vida?

— Nenhuma outra me namora mais; o destino que a bondade da morgada me offerecia... não tenho coragem para acceital-o. Assusta-me o peso do crepe.

— Nem eu lhe digo que deva acceitar esse. Mas o Augusto não terá amigos que ajudem a seguir outros destinos menos obscuros do que este e menos pesados do que o que o legado lhe impunha? Meu pae já ...

— Que quer? Não me posso vencer até pedir ou acceitar de outrem auxilios, quando Deus m’os não tem recusado ainda; nem sei até se esses destinos, que diz menos obscuros, me fariam mais venturoso. Ha indoles que nasceram affeiçoadas para a obscuridade. Incommoda-as a demasiada luz. Umas plantas querem ar, e sol e luz; outras vivem ahi em qualquer canto escuso e obscuro, e lá mesmo dão flôr. Porque é isto não sei, mas...

— Sei eu — disse uma voz da parte de fóra da janella, junto da qual se passára o dialogo...

Voltaram-se os dois ao ouvil-a. A figura do herbanario desenhava-se no vão da janella, como um retrato de velho n’um caixilho de galeria.

— Ah! o tio Vicente! — exclamou Angelo, correndo-lhe ao encontro.

O herbanario encostou-se, ainda de fóra, ao peitoril da janella, ficando assim com meio corpo para dentro da sala.

— Viva o nosso doutor — disse elle, sorrindo, a