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de uma modestia impenetravel e á sombra d’ella muitas vezes morrem. É necessario ter a vista muita exercitada n’estas explorações de almas modestas, para descobrir uma assim.

— Felizmente para os myopes como eu — proseguiu Henrique — ellas fazem ás vezes a fineza de se despojarem da sua timidez e de se mostrarem á luz. Não é verdade, prima Magdalena?

— Que admira; — respondeu Magdalena — bem occulto está o fogo na pederneira, primo Henrique, mas, percutindo-a, salta a faisca.

— Pobre rapaz; — notou a sr.a de Alvapenha — aquillo nem parece d’este tempo. O que eu não sei, primo Manuel, é porque elle se não resolveu a tomar ordens. Recusar o legado da D. Rosa!

— Não seja isso a dúvida. Elle sabe que, adoptando essa ou outra qualquer carreira, não lhe faltarão recursos para seguil-a até o fim. Devo-lhe esse auxilio, assim elle o acceitasse; mas tem um genio singular aquelle rapaz!

— É uma phenix — insistiu Henrique, ironicamente. — Vejo que não é susceptivel de discussão, impõe-se á gente como um axioma. Eu tenho habitos de livre pensador, mas... forçar-me-hei a incluir no meu credo esse dogma.

— Perdão — replicou Angelo. — Um axioma não se demonstra, e a boa alma de Augusto está todos os dias a demonstrar-se por acções generosas.

— Por favor!! Dêem como não ditas as minhas palavras! Arrependo-me da minha irreverencia, e se elle aqui estivesse, principiaria a penitenciar-me na sua presença.

— E é certo que nos falta aqui Augusto. Como te não lembraste d’elle, Angelo?

— Não viria. N’esta noite não deixaria o tio Vicente.

— Ah, sim. Esquecia-me d’aquelle pobre Vicente.

— É do herbanario que falam? — perguntou Henrique.