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—­Ouça. É preciso andar com tento na escolha do objecto d’essa paixão, sob pena de aggravar o mal em vez de minoral-o.

—­E como hei de escolher?

-De modo que lisonjeie a opinião que o primo tem de si proprio.

—­A opinião que eu tenho de mim! Se pudésse ser maïs clara...

—­De boa vontade. O primo Henrique tem uma forte necessidade de persuadir-se de que representa no mundo um grande papel, uma missão heroica e generosa, quasi providencial. Exigencias de uma vaidade de boa indole, que se lhe não pode levar a mal. Repugna-lhe a ideia da inutilidade, da insignificancia da sua existencia. Não se resigna ao papel de comparsa, ambiciona o de protector. Se o acaso, où uma inconsideração de momento, o associasse, por toda a vida, a um caracter igualmente forte, que, em constante opposicão, pretendesse provar-lhe que prescindia da sua protecção, grandes desgostos e amarguras o esperavam no futuro. Uma indole branda, dócil, fraca, um d’estes seres nervosamente delicados, que tremem ao verem-se sós, cheios de poeticas superstições, que tenha a dissipar; que se lhe apoie ao braço, como se n’elle encontrasse a coragem que não sente em si, e que, ao mesmo tempo, domine pela fraqueza e pela doçura, domine sem consciencia do imperio que exerce e sem vaidade, portanto; um caracter d’estes é que deve procurar para salvar-se; só d’elle pode esperar a realisação da vaga ideia de felicidade, que todos concebem na vida.

—­E se essa theoria engenhosa fôsse verdadeira, parece-lhe que poderia encontrar á mão o tal anjo salvador, que precisa do meu braço para se apoiar?

—­Julgo que pode, e que já o teria encontrado, se pensasse sériamente nas necessidades do seu coração.