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mysterio que inda ha pouco nos preoccupava a todos. Os meus presentimentos malignos tinham infelizmente um fundo de verdade.

D. Victoria, tendo a final comprehendido, exclamou:

— Pois seria elle! Era d’elle que o primo ha pouco falava? Por esta não esperava eu! Ora fie-se uma pessoa n’estes santos! Uma coisa assim! Ora deixa estar que eu vou... Ahi está o pago que se tira de bem fazer! Ahi está! Veremos a cara com que elle me responde. Ora deixa...

— Eu retiro-me — disse Henrique, pegando no chapéo para sair.

— Fique, primo, fique... Até é bom que ouça...

— Perdão, minha senhora. É melhor que eu não fique. Ha razões para isso... Tudo deve passar-se entre v. ex.a e elle, e, se me é licito um conselho, bom será que não seja demasiado violenta.

Apesar dos pedidos de D. Victoria, Henrique retirou-se.

Não ia satisfeito comsigo o hospede de Alvapenha. E por quê? Não tinha feito o seu dever? Por acaso não era flagrante o delicto de Augusto e irrecusaveis as provas que o acaso contra elle ministrára?

Mas em nós todos se deve ter já passado um phenomeno moral, comparavel ao que se estava dando com Henrique. Occasiões ha em que, apesar de todos os argumentos da razão, apesar da conspiração de todas as provas a justificar-nos, persiste em nós uma voz instinctiva a avisar-nos de que commettemos um mal, formulando uma accusação.

Isto sómente não succede a quem tenha adormecidos os mais generosos escrupulos da consciencia; e este caso não se dava com Henrique.

D. Victoria ficou só na sala, meditando na maneira de confundir e castigar o criminoso. Passeiava agitada, elaborando comsigo o dialogo que se ia seguir,