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e puras a applicar os esforços de intelligencia e de acção para ministrar com a educação a moralidade, e para acordar a consciencia d’esta entidade social.

Era o sr. Joãozinho das Perdizes á frente da sua freguezia, disse eu.

E é justamente este o espectaculo humilhante de que falava.

Tendes visto um guardador de cabras á frente do seu rebanho, conduzindo com acenos e assobios todas as barbudas cabeças d’aquelle regimento quadrupede? Pois vistes o mais perfeito simile da scena que se presenciava agora no adro da igreja matriz.

O povo, o povo soberano, que n’aquelle dia tinha nas mãos o sceptro da sua soberania, não era menos docil do que os irracionaes que recordamos.

O dia em que devia mostrar-se orgulhoso, era quando mais se humilhava; quando podia dispôr dos destinos dos seus senhores, era quando mais vergava a cabeça sob o pêso que estes lhe assentavam.

Não é similhante esta fôrça inconsciente do povo á do boi robusto e válido, que uma creança dirige e subjuga? Forte como elle, como elle docil, como elle laborioso, como elle util, não vê que a mesma fôrça que emprega no trabalho lhe poderia servir para repellir o jugo. Ou quando o vê, é quando o desespero e a furia o cegam e o impellem a revoltas tremendas.

Mas o povo de Pinchões, o povo do sr. Joãozinho, estava muito longe d’esses excessos.

O morgado vinha, como já disse, á frente.

A barba por fazer, as melenas despenteadas, o lenço do pescoço sôlto, sem botões o collarinho da camisa, com as mãos mettidas no cós das ceroulas, o chicote no bolso da jaqueta de pelles, as botas enlameadas até o joelho, a ponta do cigarro ao canto da bôca, o palito atraz da orelha, o chapéo sobre o occiput, dois galgos adeante de si, e o inseparavel