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— Partes?

— Se eu não posso viver aqui! Se tudo isto me está falando na filha!... A cada passo estou á espera de vêl-a... É como se a todo o instante me morresse. Vou para a cidade; dizem que estão engajando por lá trabalhadores para o Brazil... Quero vêr se o trabalho me mata, antes que o desgôsto me não tente a morrer de outra sorte.

— E dizes que partes ámanhã?

— De madrugada. Já tenho tudo prompto.

Augusto reflectiu por algum tempo.

— Far-te-hei companhia.

O Herodes olhou-o, admirado.

— O sr. Augusto?! Pois quer?...

— Quero que me batas á porta, quando passares.

— Mas que tenções são as suas, sr. Augusto?

— As mesmas talvez que as tuas. Não dizes,que queres vêr se o trabalho te mata? Por que não hei de eu tentar o mesmo tambem?

— Mas... não lhe morreu uma filha.

— E cuidas tu que só um amor de filha nos pode prender á vida? que só a morte de uma creança nos pode ferir no coração?...

O Herodes esteve algum tempo calado, com os olhos em Augusto; depois disse, com hesitação ainda:

— Não é por certo a morte d’este santo velho que o faz falar assim, sr. Augusto. Se quizesse desabafar commigo... talvez que lhe fizesse bem. Bem vê que eu sou infeliz e... havia de entendel-o...

Augusto apertou-lhe a mão, commovido.

— Pobre amigo! Não, não me entenderias; porque não basta ser infeliz para me entender. É necessario ter sido louco como eu fui.

— Louco?!...

— Sim, louco, meu bom Cancella, louco. Não te lembras d’aquelle desgraçado do Pé do Monte, que se suppunha rei? Como ria n’aquelle tempo! Um