“Mariposas” e “mosquitos” podem ser compreendidos como uma representação icônica de dois olhos que “pousam” no texto. Nesse sentido, observe a simetria fônica entre os termos: o fonema /i/ que se destaca na primeira parte de marIposas e na segunda parte de mosquItos; o fonema /ô/ que se destaca na segunda parte de maripOsas e na primeira parte de mOsquistos. A simetria constitui-se em ícone de dois olhos que observam o “texto incerto”: marIpOsas e mOsquItos.

Se o “texto é incerto”, abrem-se algumas possibilidades de compreensão: é um texto que está sendo escrito pelo próprio eu-lírico? É um texto inacabado? Ou esta sendo interpretado pelo eu-lírico? A resposta mais adequada parece ser uma síntese dessas possibilidades: o eu-lírico, enquanto leitor, constrói seu próprio texto na medida em que elabora sua própria interpretação. O texto é incerto porque pode variar de acordo com os “olhos” que nele “pousam”, de acordo com o leitor que projeta significações, baseadas em seu leque de experiências. Em última instância, esse eu-lírico busca um sentido.

O “livro aberto” funciona como metáfora da própria realidade objetiva e mundana, que sob os olhos indagadores do ser humano, é passível de adquirir significação. Os “olhos” que “pousam” na realidade buscam uma compreensão. Nessa tentativa, o que se faz é atribuir, e não extrair, sentidos.

O “mistério” nesse poema é a busca pelo sentido, ou seja, pela compreensão da realidade. Não é um processo necessariamente simples, mas representa uma característica inerente ao ser humano, que é sua capacidade de atribuir significados. É esse mesmo ímpeto que o leva a fazer ciência, filosofia, poesia. “Adminimistério” condensa essa ânsia: ad mim mistério, a vinda do mistério, dos questionamentos, a tentativa de administrá-lo e organizá-lo.

Considerações finais

Ao contrário do que disse Paulo Franchetti, lida hoje e com atenção, a poesia de Paulo Leminski pode revelar uma força lírica autônoma, independente da figura biográfica do poeta. Isso não se constitui numa regra válida e aplicável para toda sua poesia, mas deve ser problematizado em cada caso, sendo possível identificar momentos mais fortes em suas possibilidades hermenêuticas, outros mais fracos.

A categoria de “mistério” nos poemas analisados, portanto, significa a busca de um significado, seja para a vida, para a constituição de uma individualidade, seja para a relação entre indivíduo e mundo. Isso não é uma regra absoluta e geral; trata-se, aqui, exclusivamente de uma proposta hermenêutica que não pretende excluir outras possibilidades.

Etimologicamente, “poesia” vem do grego: poiesis. Em grego poiesis também é

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Anu. Lit., Florianópolis, v. 21, n. 1, p. 154-169, 2016. ISSNe 2175-7917