da sociedade são amplificadas e estendidas mesmo para essas plataformas que apresentam toda uma aura de euforia e modernidade, complementada pelos recursos gráficos. Mas, mais do que isso, pode-se admitir que as duas revistas destacadas acabam por reforçar estereótipos negativos, por não os elegerem de forma igualitária figuras de destaque e modelos de beleza. Nesse sentido, com uma enxurrada de imagens de corpos brancos, as revistas integram essa rede de significações que privilegia o branco, atestando-o como “normalidade” e operando para a internalização de posturas hegemônicas, mesmo no país das sorridentes Taíses Araújos e Camilas Pitangas, o país das maravilhas da “democracia racial”.

Ultimas considerações

Tendo-se em vista a “desaprendizagem” de que falava Spivak (2010), é necessário ir contra a hierarquização das raças e, para tanto, questionar não só os frágeis princípios de diferenciação da própria espécie como todo um aparato de valores positivos que vêm sendo atribuídos à cor branca sistematicamente nos últimos séculos e que garantem o espaço privilegiado da branca em revistas como TPM e Claudia. Assim, derrubar preconceitos raciais requer uma desconstrução da relação entre o branco e a clareza de um modo geral com um tom de pele, um grupo ou uma raça, em detrimento de todas os demais.

Portanto, a questão racial no Brasil é muito mais complexa do que pode sugerir a “brasilidade” de Camila Pitanga na capa de Claudia de 2006, ou Preta Gil em sua camiseta de donuts, na edição de setembro de 2013 de TPM. A própria seleção das modelos nas capas faz parte, juntamente com outras sutis práticas individuais e institucionais, de “um modo de pensar que naturaliza a hierarquia racial” ao mesmo tempo em que revela a natureza silenciosa do racismo brasileiro, como já sinalizou Telles (2012, p. 125).

Para entender esse processo, é preciso, então, levar em conta questões sociais e históricas, como se pretendeu expor, que reiteraram sistematicamente a superioridade branca, ao mesmo tempo em que propuseram a figura do negro como imoral, preguiçoso etc. Esse sistema que garantiria as vantagens dos que tiveram pele clara e atravessaria séculos, no Brasil, ganharia o reforço da bandeira da democracia racial e dos poderosos ideais do branqueamento, mecanismos de uma convivência pacífica à moda brasileira.

Para Schwacm (2012, p. 116), no momento, parte da democracia racial é verdade, pois, na sua visão, o país é profundamente mestiçado em suas crenças e costumes, ao mesmo tempo em que mantém um racismo invisível, com uma hierarquia dissimulada. Como reforça

ainda Guimarães (2002, p. 168), concordando com os pensamentos de Charles Wagley, ainda que a democracia racial tenha se comprovado como uma farsa, ela permanece - e deve

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Anu. Lit., Florianópolis, v.21, n. 1, p. 170-187, 2016. ISSNe 2175-7917