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nhia com as realidades do seu plano. O seu esforço para a consciência é o mais vigoroso esfôrço para fixar o desenho das vagas da Memória, sem a aventura argonáutica de deixar a praia em demanda do grande Oceano que a beija.

Mas aquelas partes da sciência, que são as fontes que a alimentam, os núcleos de invenção, são ainda o mergulho duma alma nas mais altas marés do grande Oceano da Memória.

O sábio criador é ainda e sempre o Poeta.

Newton e Dante são igualmente infinitos.

O seu pensamento tem sempre oculto, quere dizer que nenhuma leitura os exgota, porque, pela parte em que mergulham no infinito Oceano da Memória, são incomensuráveis com qualquer modo de contar, isto é, inexgotáveis, eternos e infinitos. Há, com efeito, uma distinção, e a unica que interessa, entre tôdas as obras.

Aquelas cuja riqueza é exgotável por um numero finito de leituras (e quantas nem uma só leitura compensam!) e aquelas cuja riqueza é criacionista e excedente, pois aumenta com as próprias tentativas de exaustão.

Imaginai um Arquimedes procurando exaurir um volume terminado por linhas curvas e à medida que ia descontando paralelipípedos o fosse encontrando novo e acrescido. Assim são os livros dos verdadeiros Poetas: sua própria alma, infinita dádiva do seu perfeito Amor.

Os outros... os outros podem ainda ser humildes soldados da Grande Guerra contra a Morte, sustentando com firmeza os troféus das vitórias já alcançadas.

¡Mas ai do livro que depois de lido uma vez não foi mais desejado ainda que antes da primeira leitura! Êle leva dentro de si mais esquecimento e morte que vitória e consciência.

Êsses livros que crescem, e sem fim, são os fios subtis que prendem o homem aos planos espirituais