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XVIII
PRÓLOGO

Num momento tudo ela esfarrapa e perde pelo amante. Vem a pêlo transcrever (apenas no que possa referir-se à paixão de Mariana) um pensamento de Chamfort: «Quand un homme et une femme ont l'un pour l'autre une passion violente, il me semble toujours que, quels que soient les obstacles qui les séparent, les deux amants sont l'un à l'autre, de «par la nature»; qu'ils s'appartiennent de «droit divin», malgré les lois et les conventions humaines».

Êsse lume redentor é tam vivo, que as suas Cartas estremecem e escaldam — e ela resplandece constantemente desventurosa e aureolada. Nela fulgura o génio, porque o amor profundo é também génio; e êsse brilho é o único que hoje ainda alumia a figura trivial do marquês de Chamilly — reflexo da constelação mais fulgente da epistolografia amorosa.

Sainte-Beuve comenta, a propósito do auxilio que nos deu Luís XIV, dos combates que se travaram, dos voluntários que vieram bater-se, às ordens de Schomberg: — «Qui done s'en soucie aujourd'hui? Mais le lecteur curieux que ne veut que son charme ne peut s'empêcher de dire que tout cela a été bon, puisque les lettres de la Réligieuse portugaise en devaient naitre».

Tam certo é que na poeirada e na fumarada das coisas que se perdem, um grito profundo de amor acorda e embala sempre a alma torva dos homens!

 
 

Mariana Alcoforado nasceu em Beja, de família ilustre, em 1640 — precisamente no ano da nossa conspira-