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PREFÁCIO BIOGRÁFICO

Considere V. Majestade se com viva esperança, posso estar de que sendo V. Majestade o árbitro, o Senhor, e o Mestre, haja de emendar o êrro alheio, de que êles que tam sem causa justa criminaram minha inocência, hajam de moderar o excesso a que subiram meu castigo.

Veja-se com olhos de prudência, se do mais perdido homem da República se pode crer semelhante feito, quanto mais de um, a quem pela bondade de Deus, antes dêste, se não impôs algum outro leve desconcêrto.

Ninguém ignora a paixão de que fizeram motivo alguns dos que me julgaram, para me condenarem; cujo efeito, eu mais adivinhei, que mereci, prevenindo dêle a V. Majestade muito antes de ser julgado por que sabia, que me tinha a paixão certo do dano naquele mesmo logar, onde a razão me mandava buscar o remédio.

Não houve naquela sentença uma só clausula, que não provasse o que dela referiu o público sentimento.

Não só excede a pena à mensura da culpa, nem havida nem provada, mas ainda esquecida a lei, pela qual não há degrêdo nem um assinado para a Índia, fez como todos se lembrassem da causa, por que a lei se esquecia.

Condena em degrêdo perpétuo, pena impraticável, senão contra o hereje, de cuja presença se deve velar a república.

Manda-me pagar maior quantia do que vale quanto possuo.

Castiga com privação de comenda, cousa tam sem exemplo, como sem razão; por que jàmais se viu que por crime de qualidade não exceptuada, fôsse algum