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Chegou a casa e disse ás irmãs: — «Tomae, que eu não torno lá.» — «E porque não has de tornar?» — «Porque lá estava o conde e botou-me a mão, mas eu paguei-lh'a; tirei-lhe as botas até ao meio da perna e elle caiu no canello.» — «És tola; elle é muito boa pessoa.» — «Pois provae lá a bondade d'elle, que eu a não quero provar.»

Tornaram ellas a pedir-lhe para ella lá lhes ir buscar um cacho d'uvas. — «Não vou lá, que está lá o conde.» — «Não está; não é hora d'elle lá estar.» Ella foi, chegou lá; o conde caçou-a e disse-lhe: — «Menina, já me fez duas desfeitas, mas agora não me faz outra.» — «Eu não lhe diz desfeita nenhuma; isto em mim foi a brincar; eu gosto muito da sua pessoa; até se quiser vamos descançar.» Elle disse: — «Eu acceito; veja onde a menina quer.» — «Ha-de ser ali ao pé d'aquelle poço; mas olhe que eu da banda do poço não fico que eu sou muito medrosa.» O conde ia a deitar-se da banda do poço e ella empurrou-o e botou-o abaixo.

Foi-se embora e disse ás irmãs: «Tomae lá as uvas; e eu agora sempre arrumei com elle.» — «Tu que lhe fizeste?» — «Botei-o ao tanque do quintal.»

As irmãs mais velhas foram tractar de fazer tirar o conde do poço. Elle estava muito doente com a queda e a filha mais nova passou-lhe á porta com um letreiro no braço que dizia: medico milagroso. Como o conde estava muito doente mandaram-n'a ir dentro e ella disse que lhe dava remedio, mas que era necessario que saisse a familia toda do quarto e que ainda que lá ouvissem gritos dentro que não fossem lá que era ella a saral-o. Levava uma corda e disse ao conde: — «Lembras-te quanto me puxaste pelo vestido que m'o rasgaste?» E deu-lhe uma tósa. — «Lembras-te quanto te eu tirei as botas?» Outra tósa. — «Lembras-te, diabo, quando te eu deitei ao poço?» E deu-lhe outra tósa. No fim saiu e disse ás pessoas da familia: — «Eu cuido que elle já ficou melhor, mas eu hei de voltar aqui á tarde e dar-lhe outro remedio que elle ha de acabar de sarar.» E o conde gritou