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XVI

D. Francisco Manuel de Mello no seculo XVII allude evidentemente ao conto de que publicamos uma versão com o n.º XLII e de que temos uma versão em que á heroina, chamada Maria Sabida, diz o seductor ludibriado:

«Ai Maria Sabida
Tão doce na morte
Tão agra na vida!»

Eis as palavras de D. Francisco Manuel:

«Eu cuido que vireys a ser aquella dona atrevida, doce na morte e agra na vida, que nos contão quando pequenos.» Cartas familiares, cent. V. carta 7.

No Orto do Esposo (codex alcobacense da Bibliotheca Nacional de Lisboa n.º 274), composição do fim do seculo XIV, que o nosso amigo Julio Cornu, professor na universidade de Praga, copiou e tenciona publicar, ha diversos contos entre os quaes uma versão (fol. 89-90), muito interessante do que vae em a presente collecção com o n.º LXXIV. Devemos a communicação d'esse conto ao nosso mencionado amigo.

«Hũu cavaleyro era muy namorado d'hũa dona muy filha d'algo casada. E a dona era de boa vida e non curava nada do cavaleyro, como que a elle demandava muy aficadamente. E aconteceo que morreo o marido da dona. E o cavaleyro começou de a demandar mais aficadamente. E ella mandou-o chamar e disse-lhe: «Vós sabedes que non sodes igual a mym; pero quero vos tomar por marido se vos iguardes a mym al de menos em riquezas e per esto me escusarey de meu linhagem. E o cavaleyro pidyo a elRey e aos outros senhores e trouve aa dona muyto ouro e muyta prata e muytas doas. E ella por se escusar de seu casamento disse-lhe que todo aquello era pouco se mais non trouvesse. E entom o cavaleyro teve o caminho a hũu mercador que levava muy grande aver e matou-o e soterrou-o fora da carreyra, e tomou todo o aver que levava e trouve-o aa dona. E ella entendeo que aquella requeza era de maao gaanho, e disse ao cavaleyro que se lhe non dissesse d'onde ouvera aquelle aver que non casaria com elle. E o cavaleyro descubriu-lhe todo o que fezera. E ella lhe disse que fosse ao loguar hu jazia o mercador soterrado e que estevesse aly des o se-