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O gato foi acima e viu uma presa: — «Presa, dá-me agua para eu dar ao lameiro, para o lameiro dar-me herva, para eu dar á vaca, para a vaca dar-me leite, para eu dar ao coelho, para o coelho dar o meu rabo.» — «Bastante te dou eu que bem esvaida estou, se tu me arranjares uma enchada para tapar os buracos.»

Foi o gato ter com um ferreiro: — «Ferreiro, faz-me uma enchada para eu dar á presa, para a presa dar a agua, para eu dar ao lameiro, para o lameiro dar a herva, para eu dar á vaca, para a vaca dar-me leite, para eu dar ao coelho, para o coelho dar o meu rabo.» — «Sim, faço-te a enchada, mas tu has de me arranjar uns sapatinhos que ando aqui descalço.»

O gato foi para cima e encontrou um sapateiro: — «Sapateiro, faz-me uns sapatos, para eu dar ao ferreiro, para o ferreiro fazer a enchada, para eu dar á presa, para a presa dar-me a agua, para eu dar ao lameiro, para o lameiro dar-me a herva, para eu dar á vaca, para a vaca dar-me o leite, para eu dar ao coelho, para o coelho dar o meu rabo.» — «Sim, faço-te os sapatinhos, se me arranjares dous ou tres alqueires de pão que estou a morrer com fome.»

Foi o gato ter com uns lavradores que andavam a malhar na eira e disse-lhes: — «Lavradores, daes-me milho para eu dar ao sapateiro, para o sapateiro fazer os sapatos, para eu dar ao ferreiro, para o ferreiro fazer a enchada, para eu dar á presa, para a presa dar-me a agua, para eu dar ao lameiro, para o lameiro dar-me a herva, para eu dar á vaca, para a vaca dar-me o leite, para eu dar ao coelho, para o coelho dar o meu rabo?»

Mas os lavradores atiraram com os malhos ao gato e ao coelho e mataram-nos todos dous.

(Foz do Douro.)