Era uma vez um principe; todas as vezes que vinha lavar-se á varanda do seu quarto, via defronte a filha de um lavrador, que era muito linda. Ora n’aquelle tempo a verdadeira nobreza era a dos lavradores, e por isso o principe fallava para ella, e dizia:
— Deus vos salve, filha de lavrador.
E ella respondia:
— E a vós, principe e real senhor.
Elle conversava para ella, e perguntou-lhe se não queria encontrar-se na grande feira do anno, que se fazia? Ella disse que não, mas pediu licença ao pae, foi adiante e metteu-se no quarto da estalagem onde havia de pernoitar o principe. Quando disseram ao principe que estava ali uma mulher, elle respondeu:
— É o mesmo.
Entrou para o quarto; viu uma moça muito linda, mas não a conheceu. Apagou a luz e ficaram toda a noite juntos. Pela manhã muito cedo ella arranjou-se para partir, e o principe perguntou-lhe o que é que ella queria em lembrança d’aquella noite; ella pediu-lhe a espada. O principe não teve remedio senão dar-lh’a. Passados dias, o principe fez os mesmos cumprimentos:
— Deus vos salve, filha de lavrador.
— E a vós tambem, real senhor.
— Então a menina não vae amanhã á romaria, para se encontrar lá comigo?
Ella disse que não, mas foi adiante e com tal geito que ficou no logar onde o principe tinha de dormir aquella noite. Ora já se tinha passado muito tempo, e a filha do lavrador tinha tido ás escondidas um menino, que estava a criar e era o retrato do principe. D’esta vez as cousas passaram-se como da outra, e quando foi pela manhã