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funda a cova, descobriu uma lagem, levantou-a, e deu com uma escadaria por onde desceu. Quando chegou lá abaixo encarou com a filha, que estava muito linda e muito bem vestida:

— Filha, como é que vieste ter aqui?

— Quando a minha madrasta me enterrou, appareceu-me aqui esta casa, e todos os dias vem aqui uma senhora dar-me de comer.

O pae ficou vivendo com a filha, e não quiz mais saber da mulher.

(Algarve.)



28. A DA VARANDA

Era uma vez um mercador que tinha uma filha linda como as estrellas e ladina como os diabos. Pegado á varanda d’ella era o quintal do rei. Todas as tardes ella ia regar as suas flôres, e tinha um grande manjaricão. O rei começou a gostar muito d’ella, e já a esperava á hora certa para a vêr, e perguntava-lhe sempre:


Oh menina, visto ser

De tanta discrição,

Hade-me saber dizer

Quantas folhas tem o seu manjaricão?


Ella dava-lhe o troco, dizendo:


Vossa magestade, que sabe

Lêr, escrever e contar,

Hade saber quantos bagos

De areia tem o mar?


O rei começou então a vêr se podia pregar uma peça á rapariga, e aproveitou uma occasião em que o mercador tinha sahido para fóra da terra. Arranjou uma tenda com quinquilherias, e foi vestido de tendeira a casa d’ella. A filha do mercador mandou-a entrar sem suspeitar mal; o