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tinha visto passar por ali uma menina com um cavalleiro. O ermitão levantou os olhos do chão e disse que por ali não passára viva alma. O rei foi-se embora aborrecido, e foi dizer á mulher que só tinha encontrado uma ermida com uma santa e um ermitão.

— Pois eram elles, disse a velha desesperada; se me tivesses trazido um bocadinho do vestido da santa ou um bocadinho de caliça da parede, tinha-os agora aqui em meu poder.

E tornou a fazer partir o velho no cavallo mais ligeiro que o pensamento. O velho foi avistado ainda de longe pela filha, que fez do cavallo um terreno, de si uma roseira carregadinha de rosas, e do principe o hortelão. Repetiu-se a mesma coisa; o velho virou para traz, mas a velha bruxa azoinava-o:

— Se me tivesses trazido uma rosa d’essa roseira, ou um punhadinho de terra, já cá os tinha em meu poder. Mas deixa estar, que d’esta vez vou eu tambem.

Quando a menina avistou a mãe sentiu um grande medo, porque sabia o poder que tinha; apenas teve tempo de fazer do cavallo um poço fundo, de si fez uma eiró, e do principe um cágado. A velha chegou á borda do poço, e conheceu-os logo. Perguntou á filha se não estava arrependida, e se quizesse voltar para casa que lhe perdoava. A eiró dizia com o rabo que não. A velha disse ao marido que atirasse uma bota ao poço para trazer uma gota d’agua, porque só com isso ficava com poder para agarrar a filha. Quando o rei tirava a bota cheia de agua, o cágado saltou para dentro d’ella e entornou-a toda; com a outra bota deu-se o mesmo caso.

Então a rainha muito zangada rogou ao cágado a praga que elle se esquecesse da princeza. Continuaram o seu caminho, mas a menina sempre muito triste. E quando o principe lhe perguntava o motivo da sua tristeza, ella respondia:

— É porque tenho a certeza de que me hasde esquecer.