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pediu-lhe de joelhos muitos perdões. O rapaz entregou-lhe os anneis do diabo, e n’esse mesmo dia casou com a sua namorada, por quem tinha mettido um pé no inferno.

(Algarve.)




56. A PRINCEZA QUE ADIVINHA

Havia uma princeza que adivinhava tudo, e o rei tinha promettido que se houvesse alguem capaz de lhe apresentar um caso que ella não explicasse, se fosse mulher dava-lhe uma grande tensa, e se fosse homem casaria com ella; mas tambem quando a princeza adivinhava, mandava matar as pessoas que tinham vindo á côrte apresentar-lhe o caso. Já não havia quem quizesse ir á côrte apresentar adivinhas á princeza; vae senão quando uma mulher tinha um filho que passava por tolo, e diz-lhe o filho:

— Minha mãe, eu quero ir á côrte dizer uma adivinha á princeza.

— Não sejas tolo, filho; o que é que tu lhe vás dizer que ella não adivinhe?

O tolo tanto teimou, que se metteu a caminho, e como era longe agarrou de uma espingarda velha, e eil-o se vae por ahi fóra. Andou, andou, e lá no meio do caminho viu estar um coelho n’um fraguêdo e zás, ferra-lhe um tiro. Com tanta felicidade que matou caça; pegou n’ella, e com uma navalhinha esfollou-o, e n’isto conheceu que era uma coelha, que trazia uma barrigada de coelhinhos. Não se importou com isso, e foi mais para diante e viu á beira da capellinha de um ermitão um breviario esquecido, e pegou n’elle, petiscou fogo e assou com as folhas do livro a coelha, comeu e foi andando sempre. Até que chegou á côrte; não o queriam deixar entrar, porque parecia tolo, mas elle tanto teimou dizendo que queria apresentar uma adivinha á princeza, que o deixaram entrar,