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porque assou tudo nas folhas de um Breviario com que fez uma fogueira.

O rei ficou muito admirado do talento da sua filha, e disse que como elle aldeão tinha perdido, já não podia pretender a mão da princeza, e que se preparasse que ia a morrer. Vae elle, que se fazia mais tolo do que era, diz:

— A princeza ainda não adivinhou tudo, porque ainda tenho a dizer outra adivinhação que, juro que ella não é capaz de dar com o sentido.

A princeza mandou que elle fallasse; e então disse:


Quando no paço fiquei,
Trez pombinhas apanhei,
E trez pennas lhe tirei;
Se fôr preciso as mostrarei.


A princeza ainda se pôz a considerar, mas elle tirou do seio a primeira camisa, e todos viram de que dama era; tirou a segunda, e ia para tirar a ultima camisa, quando a princeza, temendo a vergonha de se vêr delatada diante da côrte toda, virou-se para elle:

— Não mostres, não mostres, porque já vejo que és o homem mais ladino que tem vindo a esta côrte, e caso comtigo.

(S. João de Airão — Minho.)



57. A ADIVINHA DO REI

Tinha um rei um ministro em quem depositava toda a confiança; mas uma vez tal teiró lhe ganhou, que resolveu dar cabo d’elle e disse:

— Não tenho outro remedio senão mandar-te matar; mas como em tempo te estimei muito, ainda te deixo uma esperança, e é que me mandes cá a tua filha, para vêr se ella é capaz de adivinhar o meu pensamento, o qual vem