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61. O BOLO REFOLHADO

Era uma mulher casada com um homem muito ruim, que lhe batia todos os dias por qualquer coisa. Uma vez, ao levantar-se para o trabalho, de madrugada, disse elle para a mulher:

— Á noite quando vier, quero para a ceia bolo refolhado. Olha lá, toma cuidado no que digo.

A mulher não sabia o que era bolo refolhado, e foi ter com uma visinha, para vêr se ella lhe ensinava. A visinha, que tinha muita pena da vida que ella levava, disse:

— Deixe estar, que eu cá lhe arranjo isso; com certeza que o seu homem se enganou; hade ser bolo folhado. E levou-lhe á tardinha o bolo.

Quando veiu o homem do trabalho, pediu a ceia, e como não achou o bolo refolhado, berrou, ralhou, deu muitas pancadas na mulher; ao outro dia a mesma coisa. A mulher, coitada, foi ter com a visinha, e ella disse-lhe:

— Arranje-lhe vocemecê uma gallinha guisada, que póde ser isso o que elle talvez queira.

Volta o homem á noite, e mais pancadaria na mulher, por não lhe ter feito para a ceia o bolo refolhado, como mandára. Ao ir para o trabalho, outra vez a mesma recommendação. A desgraçada mulher não sabia como acabar aquelle fadario, e foi ter com a visinha a chorar.

— Deixe estar, visinha, tudo se arranja! Venha cá ter commigo á tardinha, vestida com as calças e o jaquetão do seu homem. A pobre mulher foi. Assim que chegou a casa da visinha, tambem a achou vestida com as calças e casaco do marido d'ella; e partiram ambas com os seus varapáos para o sitio por onde o homem ruim havia de vir do trabalho. Puzeram-se cada uma de um e outro lado do caminho. Quando o homem vinha a passar, diz uma:

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