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— Bate-lhe, S. Pedro!
«Porquê, S. Paulo?
— Porque pede á mulher
O bolo refolhado.

Moeram ao som d'esta cantiga o homem com pancadas, e depois de bem moido fugiram. O homem lá se arrastou para casa como pôde, e assim que viu a mulher pediu-lhe perdão de tel-a maltratado tanto tempo, e contou como lhe tinha apparecido no caminho S. Pedro e S. Paulo, que o desancaram em castigo de pedir o bolo refolhado, que era uma coisa que elle não sabia o que era.

(Algarve — Lagos.)




62. A MIRRA (mumia)

Um rapaz muito folgasão quiz dar uma grande festa no dia dos seus annos; foi por casa de todos os amigos convidal-os para virem jantar e cear com elle. Quando vinha para casa, encontrou ainda um amigo em frente do cemiterio e depois de convidal-o ficou a conversar muito satisfeito. Estando n'isto deu com os olhos em uma mirra, ou esqueleto ainda revestido de carne que estava junto de uma parede, e disse-lhe mofando:

— Se quizeres vir tambem ao banquete dos meus annos…

— Lá irei, respondeu-lhe a mirra.

O rapaz ficou espantado, e perguntou ao amigo se tinha ouvido alguma voz. Como este lhe dissesse que nada tinha ouvido, elle tambem não se atreveu a revelar-lhe o caso. D'ali se foi cheio de susto, e ao passar por casa do prior, fez confissão do que lhe acontecêra:

— O que foste fazer homem! Não sabes que não se brinca com os mortos?

— E agora?

— Agora não tens remedio senão sujeitares-te ao que