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Conto da Dama pé de cabra, lê-se: «E alguns ha em Biscaia, que disseram e dizem hoje em dia, que esta sua mãe de Enheguez Guerra, que este é o coouro de Biscaia.» Leroux de Lincy cita os Gourils, Gories ou Crious,[1] que ainda nas costas da Finisterra são chamados Courils, diabos malignos da superstição popular. No mesmo Nobiliario se encontra rapidamente narrado o conto do Rei Lear, a tradição de Merlim, e da Islavalon (Ilha do Avalon.) Um velho anexim portuguez:

Tanto vale cada um na praça
Quanto vale o que tem na caixa,

apparece-nos como um vestigio derivado d'estes versos de Roman de Brut, d'onde veiu o conto:

Tant as, tant vaux, et tant je t'aime,
Tant comme j'eus, et tant valus,
Et tant aimé et privés fus.

A tradição do Solar dos Marinhos deriva tambem d'essas lendas heraldicas fundadas na crença das fadas terrestres, como a Melusina e a Dama pé de cabra, ou do mar como as Sereias, de que falla Gil Vicente:

Vae logo as ilhas perdidas,
No mar de penas ouvinhas,
Traze trez fadas marinhas
Que sejam mui escolhidas.[2]

Martim Moxa allude a esta crença, que recebeu fórma litteraria, como a Urganda do Amadis de Gaula:

  1. Livre des Legendes, p. 167.
  2. Obras, t. III, p. 101.