Página:Contos Tradicionaes do Povo Portuguez.pdf/395

Elrey, que viu que era conhecido d'ella, e que por muito que lhe rogou não quiz dizer quem era, desejoso de o saber a fez tomar por dois homens, lhe mandou dar um a capa de agua sua, e um sombreiro, que se cobrisse e a puzessem em ancas de uma mula, e que um escudeiro com muito resguardo a levasse ao paço, e sem que fosse vista de outra pessoa alguma a tivesse até que elle chegasse, o qual se fez assi. Ao outro dia, chegadas as horas de recolher á mesa, trouxeram aquella mulher por mandado de elrey, que de novo lhe perguntou quem era e porque andava d'aquella sorte; e ella cheia de lagrimas e soluços disse:

— Estando eu n'esta casa em muito viço, favorecida da rainha e de suas irmãs, ellas me apartaram um dia, e me disseram que sua alteza estava de parto, quando a primeira vez pariu, e que ellas tinham determinado lançar um grande sapo com as páreas quando deliberasse, para dizer que aquillo parira a rainha, e que eu com diligencia tomasse a criança, que ellas m'a dariam envolta em panos, que fosse lançar no mar, e que isto faziam, porque não acertasse de parir filhos como o promettera. Tomei a criança acabada de nacer, que era um filho, e logo em minha presença tiraram um grande sapo que tinham em uma panella, e o embrulharam com as páreas; e isto feito gritaram fingindo que isto era medo do sapo e lançaram a fugir e juntamente com ellas a parteira. E com esta revolta tive tempo para me sahir do paço levando a criança commigo, e quando me vi na rua encaminhei para o mar, e fui ter junto áquelle logar donde vossa alteza me achou; desembrulhei a criança, vi que era varão, e n'isto vi vir um velho pescador; deixei a criança embrulhada nos fatos como vinha e lancei a correr fugindo. Elle como me viu deixar aquelle vulto, foi vêr o que era, e como lh'o vi erguer do chão e leval-o para sua casa, tornei-me ao paço com o rosto ledo, e disse ás senhoras que o lançára no mar. Foram contentes do que